Orgulho LGBT+: histórias inspiradoras em empresas de tecnologia
Funcionários LGBT+ de diferentes empresas dividem histórias com o IT Forum como forma de mostrar importância de ter apoio no ambiente corporativo
Quando fiquei responsável pelas matérias para o Mês do Orgulho LGBT+ desse ano, disse que gostaria de fazer uma pauta não somente falando de ações de empresas de tecnologia em diversidade e inclusão, mas conversar com personagens que realmente vivem essa realidade. O resultado disso foi um mês de trocas com pessoas de diferentes vivências, mas um desejo em comum: serem reconhecidos (as) (es) como indivíduos com direitos como quaisquer outros – independente de se identificar com a sigla LGBT+.
No Dia do Orgulho LGBT+, tenho a honra de dividir com vocês, leitores do IT Forum, histórias inspiradoras e que nos fazem ver que as companhias podem ser um lugar seguro e de apoio à diversidade.
Sal Viegas, analista de tecnologia do Itaú Unibanco
Sua história com o banco começou em 2021, por meio de um bootcamp de tecnologia para pessoas trans, onde mais 39 colaboradores foram contratados. “Fizemos um treinamento de um mês e meio para ter uma noção maior na área de tecnologia, pois o bootcamp não tinha nenhum pré-requisito fora o Ensino Médio. Isso foi importante, pois quando olhamos para as pessoas trans, o índice que conclui o ensino médio é pequeno e o Ensino Superior menor ainda. Eu já tinha algumas experiências anteriores com desenvolvimento, até por conta do meu pai que é desenvolvedor.”
Para ela, a entrada no mercado formal mudou sua vida, desde a questão da independência emocional quanto a financeira. “Sem a vaga afirmativa, mesmo que eu fizesse faculdade, MBA, eu provavelmente não entraria no mercado formal. Então, até que ponto é a pessoa se esforçar ou é o mercado estar aberto para receber?”, indaga ela.
Sal Viegas, analista de tecnologia do Itaú Unibanco
A analista explica que todos os participantes tiveram acompanhamento com o Educatransforma com endocrinologistas e psicólogos nos primeiros meses, além de acompanhamento constante do RH. Após ganharem força, criaram um Grupo de Trabalho com foco no nome social. Agora, fazem o levantamento de sistemas internos e externos para ver se há algo de errado e, se não houver a funcionalidade, como aplicá-la.
Leia também: João Torres: ‘Não existe nirvana da diversidade. Nenhuma empresa chegou lá’
“Desde que eu entrei, sempre tive oportunidade de trazer a minha história em diversas áreas do banco. Eu acho que nunca foi um incômodo porque acima de entrega, performance, o meu principal objetivo como profissional é impactar pessoas. Se a minha história vai fazer com que alguém mude de visão, entenda que está sendo preconceituoso e mude, eu acho benéfico”, diz Sal.
Ela comemora o fato de ter entrado no Itaú como desenvolvedora e, atualmente, ser líder de equipe. “Como a gente não consegue entrar no mercado de trabalho, quando falamos de carreira, esse termo não existe. A gente não pensa ‘onde você quer estar em cinco anos? Quero estar viva’. Entrar e ver que carreira é uma possibilidade, eu posso construir algo e ter esse apoio, foi algo que a minha primeira gestão trabalhou demais porque eu não sabia se queria ficar como desenvolvedora, partir para algo mais técnico ou de gestão.”
Quando pergunto o que ela diria para outras pessoas trans, ela diz o que muitos podem achar clichê, mas é verdade: nunca desistir. “Porque eu lembro de quantas vezes eu tentei entrar no mercado, quantos currículos eu mandei, e era sempre um não atrás do outro. Mesmo tendo vários cursos, estando em uma universidade federal e não acontecia a minha hora. Eu tive que me manter muito forte e recorrer a pessoas que se importavam comigo, ao invés de olhar para quem estava me fazendo sofrer.”
Maria Eduarda Bahia, team leader da Atento
Diferente de outras histórias, Maria Eduarda Bahia entrou na Atento ainda antes de transicionar. “Eu estava em um processo de me encontrar. Sonhava muito, mas tinha muito medo. Esse medo me fez estudar, entender quem eu sou aqui dentro e ter meu espaço. Quando eu entendi que meu resultado valia mais do que a minha estética, vi que estava estruturada.”
Para sua felicidade, Maria Eduarda afirma que foi totalmente abraçada pela empresa, com festas e todo o seu setor a aplaudindo de pé. “Cada etapa que eu vivi aqui dentro, como a retificação do meu nome, teve comemorações. Eles me mandaram um buquê de flores e eu me senti mais fortalecida.”
Maria Eduarda Bahia, team leader da Atento
Quando fez a sua mudança de nome, a empresa teve o cuidado de mudar todos os documentos e quando algum relatório, por algum motivo, ainda constava o nome anterior, Maria Eduarda brincava: ‘esse é meu irmão que faleceu’. E, além da parte social, Maria Eduarda já foi promovida três vezes – dando a segurança necessária de que seu trabalho era reconhecido independente de sua identidade de gênero.
“Quando eu vejo meninos e meninas trans nesse movimento e nesse lugar, me traz uma felicidade tão grande. Hoje fazemos parte do país que mais mata e não é uma escolha. A gente não escolheu quem a gente é, é um encontro. As pessoas encontram com si mesmas e buscam estar bem com o seu corpo e com a sua mente”, frisa ela.
Para ela, o segredo é ser o mais transparente possível, é ser objetiva, dizer ‘sim, eu posso’ ou ‘não posso’. Até para as pessoas sentirem você. “Eu não tenho muito segredo de carta na manga, é ser transparente e clara.”
Byu Ferreira, estagiárie de RH na TransUnion Brasil; e Gael Serrati, estagiário da área de Privacy Operations da TransUnion
Byu conta que seu primeiro encantamento foi com a Política de Reembolso para procedimentos de modificações corporais, pois soube da possibilidade de ela existir em um futuro, esse o qual felizmente foi concretizado neste ano de 2023.
“Por fazer parte do time de benefícios e ser uma pessoa pertencente à comunidade Trans, eu tive o imenso privilégio de saber com antecedência e poder auxiliar a confecção da política. No momento só consegui imaginar o quanto isso é algo importante, pois é extremamente difícil e incômodo viver com a disforia (desconforto em relação a uma ou mais partes do corpo sentido por algumas pessoas transgêneros) e infelizmente esse é um assunto que não possui muita atenção da sociedade”, diz.
Gael Serrati, estagiário da área de Privacy Operations da TransUnion
Segundo Byu, a aprovação dessa política é muito mais do que apenas ter a oportunidade de cuidar do bem-estar, é também ter a ciência de que para que possamos ser bons colaboradores precisamos estar bem com quem somos dentro e fora do ambiente corporativo e acima de tudo contar com o apoio e liberdade de ser quem você realmente é.
Já para Gael, como um Homem Transgênero, ter a oportunidade de participar ativamente da criação e revisão da política de modificação corporal para o público trans, foi de extrema importância.
“Essa inclusão permite que as minhas experiências e perspectivas sejam consideradas, garantindo que a política atenda às necessidades das pessoas elegíveis. Acredito que essa iniciativa impactará significativamente a nossa comunidade, pois promove o bem-estar e transmite um exemplo a ser seguido por outras companhias. Estou orgulhoso de contribuir para essa iniciativa.”
Vic Marchiori, gerente sênior de People Innovation da CI&T
“Eu trabalho na CI&T vai fazer quatro anos e acho que um negócio que amarrou bastante a minha história é que eu fiz a transição de gênero na empresa. Normalmente, quando as elas vão começar a sua transição, elas pedem demissão, fazem a transição de documento e depois voltam. Eu literalmente testei a cultura de diversidade dentro da CI&T. eu comecei em 2019, comecei a transição de gênero em 2021 e foi um processo muito novo para a CI&T também”, resume Vic.
O profissional, que também atua diretamente na frente de diversidade da empresa, contou que se entendeu trans dentro da companhia. “Eu também não tinha letramento e entendi que poderia ser uma pessoa trans com os conteúdos que a CI&T gerava. É muito triste porque não foi na escola, nem nos vínculos da família ou dos amigos”, revela.
Vic Marchiori, gerente sênior de People Innovation da CI&T
Apesar de ser aberto sua identidade de gênero aos poucos, primeiro com as lideranças, após decidir pela sua hormonização em janeiro de 2022, Vic decidiu escrever uma carta para a empresa. Ele se reapresentou, disse seus pronomes e se sentiu seguro sobre sua decisão. “Não passou pela minha cabeça pedir demissão. Deu medo, mas eu tinha um espaço que eu acreditava. Eu sabia que era novo, mas sabia que as pessoas poderiam ir comigo.”
“Eu sou uma pessoa que tenho um espírito bastante militante, eu entendo meu privilégio e o espaço que eu ocupo hoje. Eu tenho uma série de privilégios que me dão espaços e eu entendo que eu preciso usar desse espaço. Eu sempre fui e sou uma pessoa que traz muitas reflexões e provocações. As pessoas ao meu redor também pegaram essas características. Na área de inovação, a gente constrói muitas coisas corporativas. Hoje ninguém mais faz uma coparticipação se tiver só gente branca, ou só gente cis, ou sem pessoas com deficiência”, diz Vic.
Ele escutou de alguns colaboradores, ‘eu tenho certeza de que a sua vivência vai acelerar muito a gente’. E, para Vic, isso foi muito verdadeiro. Muita gente teve que correr com muita coisa, teve que aprender, teve que literalmente transicionar vocabulário, perspectiva, a cabeça.
Geisa Cunha, líder do Briefing Center Executivo da Kyndryl e do grupo de inclusão LGBTQIA+
Geisa Cunha, líder do Briefing Center Executivo da Kyndryl e do grupo de inclusão LGBTQIA+
Para Geisa, estar em um lugar que a respeita como é faz toda a diferença. “Para isso, a atuação dos aliados nas empresas é fundamental. Na Kyndryl, eu conto com pessoas que demonstram respeito e que defendem a causa em qualquer sala, virtual ou presencial, garantindo que todos se sintam vistos, ouvidos, incluídos e apreciados por serem quem são. Acredito que somente com essa aliança (entre LGBTQIA+ e aliados) conseguiremos promover um ambiente saudável, harmonioso e livre de preconceitos.”
Siga o IT Forum no LinkedIn e fique por dentro de todas as notícias!