Cultura engessada das empresas desafia evolução do Agile

Jorge Audy, agile coach, fala em entrevista sobre evolução do modelo e como efetivamente levar a metodologia para os negócios

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2:23 pm - 30 de março de 2019

Autor de quatro livros e um jogo intitulado Desafio ToolBox 360º, Jorge Audy (foto) é consultor sobre métodos ágeis na DBServer e professor na Escola Politécnica da PUC-RS. Com 20 anos de experiência em Agile, o profissional ministra treinamentos pelo Brasil e já conduziu projetos com diversas empresas, como Grendene, Sicredi, Renner, TicketLog, Serpro e Procempa. Em passagem recente por São Paulo, conversou com a CIO sobre boas práticas e a desmistificação da cultura Ágil. Confira o bate-papo.

CIO – Qual a importância da cultura Ágil no universo corporativo?

Jorge Audy – Até o começo do século, os profissionais eram contratados por seus conhecimentos, habilidades e atitudes – todo RH trabalhava nesse modelo. Hoje, existe um conceito bem mais forte, que é T-Shape, que visa habilidades, soft skills e head skills. Os profissionais não são mais profissionais do conhecimento, não são operários. E nesse cenário, a cultura Ágil, ou Agile, não é apenas para o universo corporativo, é sobre a evolução do indivíduo buscando boas práticas, melhoramento e crescimento contínuo, contribuindo para que as pessoas sejam menos individualistas/competitivas e mais colaborativas, dedicando-se à ‘trabalhabilidade’, que é a preocupação em ser um excelente profissional.

O universo corporativo se enriquece muito com o Agile, pois muda a mentalidade dos colaboradores, de forma que se consegue gerar mecanismos e provocações para que a inovação não se restrinja apenas a uma equipe, pessoa, engenheiro ou arquiteto.

Anteriormente, Agile era limitado à área de TI. Hoje, isso mudou. As empresas procuram o Agile por legitimidade, é uma questão de necessidade, para se apresentarem ao mercado, contratar e reter pessoas. Não é mais uma opção. Todas as empresas, pequenas ou grandes, estão se voltando para metodologias mais contemporâneas, colaborativas, auto-organizadas, com novo tipo de liderança, porque isso gera mais resultados. E em um mercado globalizado, extremamente competitivo, companhias precisam seguir essa trilha ou estão fadados à falência.

Jorge Audy

CIO – Quais são os principais desafios de se implantar a cultura Ágil e como ela é feita?

Audy – Uma das principais dificuldades reside na forte concorrência e na cultura engessada das empresas. O modo como fomos educados e como o ambiente de trabalho se apresenta, é quase impossível considerar uma pergunta como “como cada um pode tornar um ao outro um profissional melhor”. O nível de individualismo e de competição é muito elevado.

Para se implantar a cultura Ágil em uma organização, primeiramente é preciso conversar com executivos da empresa, pois um dos maiores fatores de sucesso, segundo pesquisas internacionais, é o apoio da alta direção. Desmistificar Agile faz com que eles possuam uma visão convergente.

O próximo passo é mapear oportunidades, equipes, projetos, processos, serviços para escolher por onde começar (conceito Dojo Boshú) para depois testar e avaliar a cultura organizacional, metodologia, boas práticas etc. Isso é realizado em algumas semanas. Após essa etapa, aplica-se um treinamento (teorias, educação). Em seguida, é preciso rodar um piloto, estabelecendo um ciclo frequente de conversas sobre pontos positivos, negativos e resultados.

Esse conjunto vai estabelecer uma forma de trabalhar, que será acompanhada por pessoas que têm a responsabilidade de cultura, de evolução, de adoção de novos métodos na organização. A partir disso, escolhe-se se haverá outro piloto ou se vai disseminar para outras equipes, outras áreas, de diferentes formas. Nesse processo, é natural que outras áreas comecem a absorver práticas que são interessantes para elas.

Em meu workshop, ao decorrer de um dia, utilizo um jogo e uma técnica multiuso [criada por mim], conhecida como Desafio ToolBox 360° e ToolBox Wall. O jogo contém um tabuleiro e um baralho de boas práticas, desde estratégia, modelagem, validação, planejamento, execução, lições aprendidas até melhoria contínua. A técnica de mural usa mais de 125 boas práticas, que são manipuladas e debatidas por amostragem sob diferentes abordagens, por meio da colaboração de pares de diferentes áreas e hierarquias. Todo tipo de profissional pode passar pelo treinamento, pois foca em etapas fundamentais de qualquer projeto. Nele, são ensinadas técnicas contemporâneas de planejamento e ideação e modelagem para descobrir novas formas de se executar um processo, produto ou serviço.

CIO – O que os colaboradores mais buscam quando se interessam por Agile?

Audy – A maioria (90%) busca uma receita de bolo. Mas isso não existe, pois há sempre um viés cultural. A organização tem sua complexidade, produto, serviço, tecnologia, lideranças. Existe uma série de fatores que impossibilita ter uma receita pronta. Existe apenas um ponto de partida, um modelo orgânico/sistêmico, que é a partir dos acontecimentos. No processo, os ajustes acontecem de acordo com o andamento.

Para aqueles que seguem em frente com o Agile, os desafios são grandes, como abandonar a zona de conforto, o choque de realidade dessa nova abordagem e o desafio da colaboração, usando a força do coletivo, dividindo a carga. Muitos desistem por ser trabalhoso, ficam chocados ao perceberem que existem muitas técnicas que podem ser apropriadas para crescimento e desistem pela dificuldade de equilibrar a vontade de inovar, descobrindo novas oportunidades de aprendizado, com outras tarefas obrigatórias do trabalho.

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