TI exerce papel essencial na transformação da AL

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9:20 am - 20 de junho de 2017

Seria a América Latina uma região fadada ao fracasso? Por que as coisas tardam a acontecer mesmo quando todos os ventos sopram a favor? Para o sociólogo Fernando Calderón, diretor do programa de inovação e multiculturalismo da Universidade General San Martí, na Argentina, por questões culturais, os países da região não conseguem navegar conforme sopram os ventos e têm uma tendência a apostar 100% de um lado ou de outro, o que faz com que não aproveitem de forma adequada os momentos de bonança e sofram mais com as quedas econômicas. Soma-se a isso o fato de não conseguirem aproveitar o impacto tecnológico para gerar algo diferente do passado e construir uma trilha capaz de gerar conhecimento aproveitando as capacidades locais.

Calderón, que acaba de ser eleito para a Cátedra Simón Bolivar na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, falou sobre o tema na abertura da segunda edição do IT Forum Latam, que acontece até o dia 21 de junho, em Miami. Ehttps://itforum.com.br/wp-content/uploads/2018/07/shutterstock_528397474.webpso sobre região, ele foi desafiado a trazer parte de sua pesquisa para o tema central do encontro que é “A Vida em Três Atos: Mudança, Medo e Atitude”.

Sua apresentação foi dominada pelos achados de uma vasta investigação que passou por praticamente todos os rincões latinos, incluindo Brasil, e do qual extraiu sete características das mudanças que estão em curso na América Latina: individualismo e consumo; cultura de tecnossociabilidade; redefinição de diversidades e identidades; cultua de imigração; a nova religiosidade; e o ativismo ecológico.

No contexto apresentado pelo especialista, a mudança cultural se converteu para a região em um ponto até mais importante que economia quando se analisa os problemas que cada um dos países enfrenta, e isso lança uma responsabilidade muito grande para quem está no mercado de tecnologia uma vez que essa mudança cultural e de modelo de sociedade passa profundamente pela adoção de aparatos tecnológicos, além da ampliação do acesso à internet e da propagação de fóruns de discussões e novas formas de ativismo.

É interessante notar que para cada uma das sete tendências projetadas por Calderón, o impacto e/ou influência da tecnologia sempre aparecia, desde a simples disseminação do acesso à internet e do fenômeno das redes sociais que se agigantaram na região com engajamentos que superam métricas globais em muitos casos, passando pela mais alta tecnologia e soluções emergentes ainda em ponto de maturação. No caso da conectividade, fica claro o impacto no ativismo, mas houve e segue havendo influência na questão migratória, uma vez que, por meio de canais como Facebook, imigrantes espalhados pelo mundo se comunicam e se unem contra discursos xenófobos.

Por outro lado, critica o especialista, muito do que se vê ainda não reflete em produção intelectual para dentro. Existe uma tendência apenas de utilizar esses meios projetando-se para fora. “Estamos incluídos na rede, mas decidimos pouco sobre a globalização. A sociedade em rede se sobrepõe aos modelos antigos e é uma mudança muito forte. Tem progresso, mas tem consequências que podem ser negativas: individualização, família e escola, mercado de trabalho, relações de poder, sexualidade, tensões entre indivíduo e coletivo, autodeterminação. Mas temos que lembrar que o mundo todo vai mundo mal em liberdades gerais, não é só uma coisa da AL”, reflete, para completar: “Além disso, o engajamento nas redes sociais é muito forte. Mas é um engajamento mais voltado ao exterior e ao consumo que à produção de inovação, além de ser desigual entre países, profissões.”

Levando para um lado mais prático e até traduzindo esse tipo de achado para o dia a dia da TI, Calderón acredita que empresas e indivíduos precisam e têm condições de utilizar melhor o poder da tecnologia para levar a cabo essas transformações, mas de maneira que elas sejam efetivas, duradouras e sustentáveis. Existe uma discussão muito ampla a ser feita sobre todas as questões estratégicas que precisa levar em consideração os aspectos históricos-culturais para lançar luz ao futuro.

É saber, explicou, utilizar a tecnologia realmente não como fim, mas como um meio que permite novas formas de socialização e inovação. Olhar superficialmente para tudo o que acontece incorre em erros básicos. Por exemplo, é fácil dizer que a nova geração é conectada e super aberta às tecnologias emergentes, mas é errado pensar que é isso e pronto. As preocupações dessa geração já são diferentes dos jovens de há alguns anos. Se antes desemprego e acesso à educação causavam temores, hoje é o desemprego e a violência. E por quê? Houve um movimento forte para incluir mais pessoas no sistema educacional, mas a geração de trabalho não foi suficiente e agora essas pessoas ainda concorrem com as soluções tecnológicas. Com mais desocupados, aumenta a violência. Cria-se um círculo vicioso.

“O novo tipo de cultura que emerge traz o que chamamos de tempo instantâneo, se rompeu com o tempo da indústria. Hoje o funcionamento de uma empresa é de 24 horas e acontece a cada instante e pode ser reproduzido em diversos lugares. Combina local com global. É uma aceleração do tempo e também um redimensionamento dele. Temos também o desafio da participação, parte dos jovens quer e pode e parte não quer ou não pode, como uma polarização. Os jovens topam misturar passado e futuro, mas querem resultado prático, acabou a cultura de retórica do passado, por isso desconfiam da classe política na região, buscam propósito”, arremata o sociólogo.

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