Padronização de APIs trará benefícios à telecomunicação brasileira

Crescimento por meio de redes neutras será mais rápido se todos padronizarem linguagem para se comunicar

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8:16 am - 24 de maio de 2022

As APIs – Application Programming Interface ou Interface de Programação de Aplicação – já são usadas há mais de duas décadas e basicamente são um conjunto de normas que permitem a comunicação entre aplicações por meio de padrões e protocolos estabelecidos.

À medida que a digitalização da economia se acelerou, as companhias passaram a criar, expor e gerenciar APIs com mais velocidade. É por meio delas que uma infinidade de aplicativos e sistemas facilitam o cotidiano de pessoas ao redor mundo. Aplicativos de transporte de passageiros, delivery de comidas ou de banco digitais, por exemplo, são baseados em APIs.

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No Brasil, o mercado de serviços financeiros foi um dos segmentos propulsores do uso das APIs por meio das iniciativas de Open Banking e Open Insurance, mas já se discute a evolução do mundo “open” para os mercados de saúde, educação e varejo.

Redes Neutras e a expansão dos serviços de telecomunicações

Há cerca de dois anos o mercado de telecomunicações brasileiro observa o crescimento de um novo modelo de negócio, baseado no conceito de Redes Neutras fim-a-fim, como já acontece em países na Europa como Portugal, Itália, Reino Unido e República Tcheca. Neste modelo, muitas operadoras compartilham a mesma infraestrutura de fibra óptica para oferecer os serviços de telefonia e internet.

Tradicionalmente as empresas usam a própria rede e a infraestrutura de terceiros é usada pontualmente. Agora isso tende a se inverter. Esse movimento, que já acontecia antes do leilão das faixas de 5G, deve aumentar com a implementação da nova tecnologia, que irá requerer muitos investimentos no setor de telecomunicações e um número maior de antenas, devido à utilização de frequência mais altas com menor alcance da nova tecnologia.

Para que a expansão por meio de Redes Neutras ocorra e alcance todo o seu potencial técnico e financeiro, gerando benefícios para as donas da infraestrutura, para as MNOs (Mobile Network Operators), prestadoras de serviços de telecomunicações, que fornecem comunicação sem fio de voz e de dados; para as MVNEs (Mobile Virtual Network Enablers), que serão responsáveis pela interligação entre as empresas que oferecem a infraestrutura e as operadoras virtuais que comercializam o serviço para o consumidor final; e para as MVNOs (Mobile Network Virtual Operators), que não possuem rede própria nem frequência e utilizam a rede de outras operadoras, é necessário que todo o setor se prepare para enfrentar alguns desafios.

O principal deles é a padronização das integrações, ou neste momento a falta dela. Esse desafio pode ser superado por meio da adoção de APIs em substituição a ainda usada troca de arquivos ou autosserviço, por meio de portais, para as empresas clientes.

Padronização dos serviços de rede e o uso de APIs 

A operação de telecomunicação pode ser dividida em duas camadas, serviços de negócio e serviços de rede. Na camada de negócio é mais difícil padronizar as APIs, pois as áreas comercial e de marketing precisam de liberdade para criar produtos novos e diferentes, que gerem atração aos clientes das MVNOs. Esses planos podem atrair o torcedor de um determinado clube de futebol, clientes já fidelizados de seguradoras ou redes varejistas, ou mesmo um consumidor que prefira ser impactado pela publicidade em troca de benefícios em seu plano de telefonia.

Dessa forma, a padronização precisa ocorrer sem gerar travas para os produtos oferecidos ao consumidor final. E mesmo nesses casos podem ser definidos um conjunto de APIs padrão a serem utilizadas pelas MVNOs, MVNEs e MNOs, reduzindo os processos manuais, que tanto tiram a eficiência do ecossistema. Já os serviços de rede podem e devem ser padronizados, pois, para qualquer serviço ter eficiência são necessários processos repetitivos e bem estruturados, que possam ser automatizados.

Mesmo nas empresas que já usam APIs é comum a utilização restrita e em integrações ponto a ponto. O problema é que ao invés de padronizar uma integração, cada empresa cria a sua e fazendo com que seja necessário construir uma integração diferente com as demais.

As empresas desse ecossistema devem blindar a sua rede e operação, definindo os serviços que são suportados, com os devidos parâmetros consumíveis, criando uma camada, no meio do caminho, que faça a tradução. Na camada de negócios é possível colocar o serviço que a MVNO quer oferecer e que serão “traduzidos” para gerar uma comunicação precisa com a camada operacional.

Por exemplo, quando chegar uma ordem para vender um determinado plano, essa informação deve ser traduzida como um plano com 10 GB de capacidade por mês e sem limites de voz. Ou seja, haverão parâmetros de rede independentes de quais serão os nomes dos produtos. Quando for feita a venda ao cliente final, uma MVNO pode utilizar um nome e em outra o mesmo plano terá outro nome.

A adoção massificada de APIs padronizados no setor de telecomunicação deve seguir os seguintes passos:

  • Definir e padronizar toda interface com a área de operações através de um conjunto de serviços e APIs bem definidos;
  • Criar o mapeamento dos serviços de rede e de clientes para se ter a flexibilidade de múltiplos planos e serviços;
  • Mesmo na camada de negócios trabalhar com modelos de APIs buscando a padronização, evitando integrações que requeiram atuação manual ou transferência de arquivo;
  • Buscar, na medida do possível, APIs padronizadas de mercado como TM Forum, associação que une mais de 850 empresas de 180 países, o que facilitaria a integração de todas as empresas do setor de telecomunicação;

Quando o setor, como muitos outros, depende depende cada vez mais da integração entre várias empresas para oferecer serviços de qualidade, as empresas de telecomunicações também precisam adotar processos mais customer centrics e tecnologias que possam agregar valor e facilitar a integração.

Benefícios das redes neutras

Entre as vantagens da adoção do modelo de Redes Neutras para a expansão dos serviços estão: compartilhamento do Capex e decorrente custo de infraestrutura para todas as empresas envolvidas, desde as donas das Redes Neutras até as MNOs e MVNOs.

Outra vantagem é a eficiência logística, por meio da redução no volume de cabos de fibra óptica que são instalados nas torres de energia e dos processos burocráticos para a instalação desta fiação, visto que ao invés de várias empresas precisarem conseguir a autorização para a instalação da infraestrutura, uma única empresa seria responsável pelos cabos de fibra óptica, que serão alugados pelas demais operadoras.

O crescimento e a expansão dos serviços de telecomunicações em todo país, por meio de Redes Neutras, trará benefícios também ao cliente final, que terá mais opções de ofertas de qualidade no mercado e poderá encontrar uma opção mais alinhada às suas necessidades.

* Laerte Sabino é CEO da Icaro Tech

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