Publishers devem terceirizar mais serviços ao Brasil para produção de jogos, diz presidente da Abragames

Abragames espera crescimento de dois dígitos do mercado em 2024 e vai investir em internacionalização e formação dos empresários do setor

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3:00 pm - 18 de janeiro de 2024

Não é preciso ouvir muito o presidente reeleito da Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games (Abragames), Rodrigo Terra, para entender por que ele será o responsável pela gestão da entidade no triênio 2024-2026.

Com conhecimento grande do mercado de jogos e fazendo projeções muito interessantes sobre o cenário brasileiro para este ano – Terra conversou com a Coluna Além do Gameplay e ressalta a importância de investir em internacionalização e formação dos empresários do setor, a expectativa de crescimento double digits dos negócios em 2024 e como a prestação de serviços deve ganhar força este ano. “Temos esse reconhecimento global (das publishers) e estamos em um momento favorável de ter novos projetos e contratações de times para terceirização de etapas de processos produtivos de um videogame”, ressalta.

Terra é co-fundador e Chief Technology Evangelist da ARVORE Immersive Experiences, ganhadora de diversos prêmios com seus jogos e experiências imersivas, além de pós-graduado em Administração pela FGV, radialista de formação pela FAAP e professor de pós-graduação na ESPM-SP. A entrevista com o novo presidente da Abragames será publicada em duas partes aqui na coluna e você confere abaixo a primeira delas.

Rodrigo, como você avalia o ano de 2023 para a indústria de games brasileira – pensando que tivemos excelente impacto nos principais eventos, a chegada da Gamescom no País a partir desse ano e uma movimentação bem interessante no cenário internacional. Que pontos você destacaria em relação a esse ano que passou que realmente geraram impacto nos negócios?

O ano de 2023 tivemos uma consolidação do País no cenário internacional como potencial polo produtor. Já somos um polo produtor, mas hoje ocupamos a 13ª, 12ª posição no ranking de países produtores de videogame. Como consumidores somos top 5 e, dependendo da plataforma, até podemos ser terceiro. Isso mostra o potencial caminho também para podermos crescer também no mercado produtor de videogames.

Foi um ano de desafios, que continuam em 2024. Desafios estruturantes, dado o próprio modelo de negócio da indústria em todo o mundo e veremos uma grande dança das cadeiras, um reshaping, em relação aos modelos de negócios.

Isso faz com que o Brasil tenha uma boa posição, um potencial que está sendo destravado, e que culminou na chegada da Gamescom, que é uma conquista da Big Festival, que completou 10 anos de ambiente de negócios no País, e vem sendo o pilar de confiança da Gamescom para aterrissar com a marca. O interessante é que os alemães vieram para somar em um evento que continua sendo majoritariamente brasileiro.

Também tivemos um crescimento de indústria: as exportações aumentaram, vendemos mais lá fora, os estúdios mais ou menos se mantiveram segundo nossa última pesquisa, e esperamos que cresça mais em 2024 e 2025 quando vierem aí as novas políticas públicas de fomento ao setor e assim podermos gerar mais empregos e manter os nossos talentos aqui (no Brasil).

Em relação a lançamentos dos estúdios brasileiros para plataformas de alcance global, 2023 foi bom comparado a 2022? Quais títulos você particularmente destacaria? Qual o principal desafio dos nossos estúdios como negócio, para potencializar ainda mais novos títulos e rentabilidade para 2024?

Posso destacar a atuação do empresário brasileiro. São estúdios que ainda estavam com projetos de pandemia, que foram começados em 2020, 2021, 2022 – lembrando que um projeto pode ser de 6 meses a 4 anos. Estamos vendo títulos que estavam represados, advindos da pandemia, e só por isso já dou um crédito enorme para os estúdios que sobreviveram e se sobressaíram. E sim, a quantidade de games lançados em 2023 foi ligeiramente maior do que 2022.

O desafio vai ser continuar sobrevivendo até acabar esse “inverno do games”. Vemos uma desaceleração do investimento de publishers em projetos, o que isso impacta direto nos estúdios que tem uma dependência de capital internacional. Houve uma desaleração global e impactou o Brasil de certa forma.

Leia também: Gamescom Latam quer US$ 150 mi em negócios e consolidar Brasil como hub de games

A parte de serviços desaqueceu em 2023 para reaquecer em 2024, pensando na perspectiva do cenário que temos uma grande massa de desligamento em grandes estúdios, publicadoras, empresas de jogos, e temos uma mudança de priorização e corte de custos. Ou seja, a terceirização de parte dos processos vai aumentar. Como o Brasil é um território de reconhecimento favorável a empresas de terceirização, no termo do nosso setor chamamos de “external development”, a gente tem esse reconhecimento global, estamos em um momento favorável de ter mais novos projetos e contratações de times para terceirização de etapas de um processo produtivo de um videogame. Isso vai colocar a gente em grande destaque, em um momento que mais empresas vão fazer mais terceirizações nos processos produtivos.

Mas é claro que o setor de videogames não funciona apenas sendo serviço. Temos o desafio para potencializar nossas próprias propriedades intelectuais, em um ambiente que se investe menos em títulos próprios que querem mais segurança. Toda a crise, não importa o setor, faz com que se aposte em soluções mais seguras. No caso do videogame, a aposta nas propriedades intelectuais, as franquias, mais conhecidas. Então o título original acaba ficando despriorizado. Isso não quer dizer que é para sempre.

Temos que olhar também para a competividade das empresas, que vai trazer um novo desafio interno, que é melhores condições para nosso ambiente de negócios. Precisamos deixar nossos estúdios mais competitivos e para isso temos que jogar juntos com iniciativa privada, que venha e invista aqui, e jogar junto com o governo, que tem se mexido aos poucos para trabalhar junto com o ambiente de negócios de videogame, mas com expectativa que aumente a atenção e as ações voltadas ao setor em 2024.

 No que diz respeito a evolução dos estúdios brasileiros, quais são as principais dificuldades de consolidação dessas empresas até de que fato elas comecem a ter sucesso no mercado e sejam rentáveis?

Olha: videogames, diferente de outras áreas do audiovisual e da tecnologia, tem uma barreira de entrada muito baixa. Basta um computador, estudar uma engine (motor gráfico), e aí você consegue fazer um jogo inclusive comprando coisas prontas – basta ter um pouco mais de habilidade plural em arte, estudar game design, programação, e se faz um jogo bem básico muito rápido. Isso não quer dizer que você vai ter sucesso. O problema é se você quer fazer disso um negócio.

Aí é preciso começar a entender que jogos demandam grandes somas de investimento, entender que não se faz jogo comercial sozinho. Vai precisar de equipe, gestão, visão de negócio, de estudos mercado nacional e internacional, marketing, financeiro, jurídico…Se começa a entender que é “muito mais embaixo” o negócio do videogame. Então, quando se começa a entender esse grau de dificuldade, que é a fase 2 do negócio, é onde se vê que não temos estruturas no País que ensinam – algumas poucas como as incubadoras que tem dado certo para poder ajudar um estúdio a poder se levantar, ou mesmo o Google com o Indie Games Fund. Quando se chega o momento de sair do “faça o jogo” para “tenha uma empresa” é onde vemos o grande momento.

Começamos a ver as empresas tendo sucesso quando elas entendem essa questão da gestão, ou entendem em parte, e começamos a fazer estratégias de negócios do business do videogame. E aí quando também entendem que o mercado internacional é importantíssimo, isso implica você sair com seu jogo em inglês, localizar o jogo para outras línguas, reinterpretando partes e elementos visuais, e até mesmo, dependendo do país, é preciso mudar mecânicas do jogo, porque alguns locais podem ter censura ou restrição, portanto começa a ficar complexo. Por isso o momento chave da virada é quando você sai do negócio “quero lançar um jogo” para “agora tenho uma empresa e como eu persevero”.

Por fim, Rodrigo, pensando em projeção de negócios para 2024, pode nos revelar qual é a perspectiva de vocês para o crescimento do setor? Algum número de evolução de estúdios ou mesmo de faturamento que vocês estão enxergando para o ano que vem? Mencione também as prioridades da Abragames para o próximo ano para que de fato vocês consigam atingir os objetivos da Associação. 

Boa pergunta. Só no ano passado, tivemos um giro de R$ 150 milhões em negócios – isso só durante o Big Festival. Estamos vendo uma perspectiva muito maior de geração de negócios (para 2024), então imaginamos o crescimento continuar em duas casas, por mais ainda que vamos enfrentar desafios do “inverno dos games”, e acho que o mercado brasileiro vai continuar respondendo.

Em relação ao número dos estúdios esperamos que deva crescer, mas não tanto. O Marco Legal dos Jogos Eletrônicos vai fazer uma grande mudança nesse sentido se a gente conseguir que ele aconteça até o fim do primeiro semestre, e aí veremos uma mudança grande em 2025, e imaginamos que o mercado vai sofrer um boom, a depender também das políticas públicas que também saírem e da atração dos investimentos privados. A gente tem aí um 2024 muito seminal para pavimentar o crescimento da indústria em 2025.

Em relação as prioridades, vamos de fato aumentar nosso investimento em internacionalização e formação dos empresários, que vão acontecer a partir de fevereiro. Vamos continuar também investindo na parte de políticas públicas, e nosso trabalho em Brasília para que a gente consiga ter uma ótima representação dentro desse avanço de melhoria de ambiente de negócios e atração de investimento privado e abertura de melhores políticas públicas. E a gente também vai olhar para que a própria Associação cresça – então devemos fazer mudanças na parte de estrutura da Abragames para que ela consiga crescer junto com o mercado. E por isso deveremos anunciar mais novidades em termos de estrutura logo mais.

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