Histórias que ninguém me contou

Author Photo
12:25 pm - 05 de outubro de 2015


Das mesquistas, ecoam os cantos que convocam os fiéis para a hora da prece. Um momento de parar para refletir, reafirmar a fé e agradecer. É tempo de Ramadã, mês sagrado para o Islã, quando o profeta Maomé teria recebido a revelação do Alcorão. Em Istambul, uma metrópole com cerca de 20 milhões de habitantes, não há lugar que o som melódico e penetrante, entoado do alto dos minaretes, não percorra. Percorre cada extensão da pele.

Em Jerusalém, a experiência é semelhante: em frente ao muro das lamentações, pedaço do planeta mais sagrado para os judeus, homens, mulheres e jovens rezam, mas também cantam e dançam em rodas durante o Shabat, dia de descanso e renovação espiritual. Uma demonstração de que os seguidores ortodoxos, vestidos de preto e disciplina, constituem apenas parte da verdade. Porque a outra parte é festa, vibração. E vibra lá no fundo, para dentro da pele.

Eu sabia o que buscava quando parti em direção ao Oriente, colocando no roteiro de viagem três territórios em que política, cultura e religião tecem uma mesma teia. Turquia, Israel e Jordânia. Marcos das três tradições monoteístas nascidas a partir da crença do profeta Abraão. Queria encontrar a conexão e o entendimento que a literatura e a história não proporcionam.

Encontrei rápido, e de formas imprevisíveis. Em Petra, durante a descida pelo cânion que leva até o palácio Al Khazneh, famoso monumento esculpido na pedra, uma menina de mais ou menos 7 anos nos abordou. Disse para minha esposa: “Deixa eu cobrir seus ombros”. Cássia agachou para que a criança alcançasse o lenço laranja que envolvia a sua cabeça, mas expunha os braços a cada rajada de vento. Um gesto lindo, que gravei com meu celular. Registrei também a gentileza de um guia de camelos, que ofereceu a própria camisa para “cobrir a minha mulher”.

E não é que desconhecíamos as tradições locais. No destino anterior, a Turquia, já tínhamos nos conectado com um país muçulmano e tomado os cuidados recomendados, como o uso de véu para as mulheres. Istambul, uma cidade moderna e acostumada com o estilo de vida ocidental, acabou se tornando nossa referência. Um erro inocente. Porque nos esquecemos de que, na Jordânia, ombros de fora não são aceitáveis.

Oportunidades como essa mostram como, muitas vezes, julgamos compreender um povo, ou uma cultura, quando estamos presos a estereótipos, a uma definição incompleta. Em Petra, me senti responsável. Eu tinha o dever de respeitar aquela realidade, e sair de lá sem deixar rastros, impactos, questionamentos.

Meu propósito foi totalmente atendido quando testemunhei, sem que ninguém precisasse me contar, o quanto a religião move as pessoas. Ampliou minha capacidade de compreensão, de agir como facilitador do diálogo. Renovou minha convicção de que o ser humano pode ser muito melhor quando aceita a diferença, em vez de confrontar ou impor a sua filosofia. É o que sempre pratiquei na minha empresa, um lugar onde as pessoas devem se sentir livres para acreditar no que quiserem. Porque o único caminho que existe é o do respeito um pelo outro.


Newsletter de tecnologia para você

Os melhores conteúdos do IT Forum na sua caixa de entrada.