Em casa, no mundo: a vida dos programadores brasileiros que trabalham no exterior

O mercado global exige habilidades além do código, como networking, comunicação e se adaptar a diferentes culturas

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4:43 pm - 12 de setembro de 2024
Da esquerda para a direita: Tiago Santos, Gabriel Ferreira e Leandro Baptista. Imagens: divulgação

Os últimos anos têm sido marcados por uma crescente inserção de programadores brasileiros no mercado global, uma tendência refletida tanto em estatísticas como em depoimentos de profissionais do setor. 

Leandro Baptista, Global Head of Talent Acquisition da Global Career Summit  e Gabriel Ferreira, Developer Relations na Meteor, dois desses brasileiros, refletem sobre suas experiências em empresas de fora e discutem as nuances de ser um “global worker”. 

Em entrevista para o IT Forum, Leandro Baptista conta que sua trajetória começou por acaso. “Eu sou originalmente da área de marketing, mas caí de paraquedas na carreira de tecnologia internacional. Fui um dos primeiros a falar de carreira internacional no LinkedIn lá por 2018, 2019, quando comecei a trabalhar para a Austrália sem sair do Brasil”, diz ele.

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Da Austrália ao Reino Unido, passando por Portugal, Baptista foi se consolidando como uma referência no recrutamento internacional para empresas de tecnologia, consolidando eventos como o Global Career Summit, que levou mais de 5 mil desenvolvedores brasileiros para processos seletivos com empresas de fora. “Na última edição, tivemos 200 contratações e, para a próxima, que vai acontecer em outubro, já temos confirmadas várias vagas para os Estados Unidos, Áustria e Lituânia”. 

Gabriel Ferreira, por outro lado, teve um percurso mais linear. Programador desde 2007, ele começou sua carreira no interior de São Paulo e, após anos em desenvolvimento de software, migrou para o ensino e a criação de conteúdo. Em 2022, decidiu se arriscar fora do Brasil. “Comecei a trabalhar remotamente para uma empresa da Estônia. Fui para lá três vezes durante o ano e fiquei. Fiz muitas conexões, o que abriu portas para outras oportunidades”, conta.  

Entretanto, o programador também lidou com desafios, como a preocupação com o inglês limpo, mas sua percepção mudou com o tempo. “Percebi que o meu sotaque brasileiro ao falar inglês não era um problema. O time era global, e algumas pessoas nem falavam inglês tão bem. Desde que você conseguisse se fazer entender, ninguém se importava”. 

Tiago Santos, CEO da Husky, a fintech brasileira que conecta freelancers e contratados internacionais a soluções de pagamento globais, reforça esse ponto: “O inglês é fundamental para quem quer ter uma carreira internacional, mas não é preciso ter nível avançado ou falar como um nativo. O requisito é saber se comunicar e entender as demandas do dia a dia com os colegas de outras nacionalidades”. 

Entre a ‘meritocracia’ selvagem e o equilíbrio europeu 

Tanto Baptista quanto Ferreira destacam as diferenças entre as culturas de trabalho das empresas do Brasil e da Europa. “No Brasil, tem essa coisa de ‘corre, corre, corre e entrega muito’. O seu valor é medido pelo seu esforço, em uma ideia de meritocracia meio selvagem”, comenta Baptista. “Já na Europa Continental, como Espanha ou Lituânia, a galera preza muito pelo equilíbrio. Sexta-feira, às quatro da tarde, você não encontra ninguém no escritório”. 

Ferreira também notou essas diferenças ao trabalhar com uma startup da Estônia. “A partir do primeiro mês de trabalho, você já começa a acumular dias de férias. Depois de um mês, você pode tirar férias, se quiser. Eu fiz isso logo no começo. É muito diferente da rigidez que a gente vê nas empresas brasileiras”. Esse respeito pelas pausas e pelo tempo livre é um dos motivos que leva muitos brasileiros a preferirem trabalhar para empresas europeias. 

Networking, a chave para o mercado global 

A pesquisa Global Worker 2024, conduzida pela Husky, revela que um terço dos brasileiros que trabalham no exterior foi contratado por indicação de colegas, e 30,8% foram prospectados por recrutadores estrangeiros. “Isso mostra o quanto o networking é importante para os devs que buscam vagas internacionais”, enfatiza Santos. Ferreira ecoa o ponto com um conselho, “É essencial criar uma rede de contatos e manter um perfil atualizado no LinkedIn”.  

Quando questionados sobre o impacto da inteligência artificial nas carreiras de programadores, ambos são céticos quanto a um cenário apocalíptico. “Toda vez que surge alguma coisa nova, dizem que vai acabar com a profissão”, reflete Ferreira. “Mas, na verdade, o que acontece é uma adaptação. Certos trabalhos mais repetitivos, mais manuais, talvez sejam automatizados, mas os desenvolvedores vão focar em tarefas mais estratégicas.” Ele ressalta a importância de não se deixar levar pelo sensacionalismo: “A gente vai continuar precisando de pessoas que saibam gerenciar e adaptar essas tecnologias.” 

Além disso, Ferreira observa que “tem muita empresa gringa aqui que está fazendo seleção usando IA. As primeiras triagens são feitas por um robô, e só depois chegam no recrutador humano.” 

Baptista ecoou o ponto, mas complementa dizendo que “o jogo virou, agora os candidatos também estão usando IA para preparar seus currículos e aplicar para centenas de vagas de uma vez”. Para ele, essas mudanças apontam para uma disrupção na maneira como se contrata pessoas, uma tendência que vem com mais força lá fora do que no Brasil. 

O mercado global, apesar das suas complexidades e desafios, se abre como uma possibilidade cada vez mais concreta para programadores brasileiros que buscam novas oportunidades. E, como mostram as histórias deles, navegar nesse novo território é mais uma questão de adaptação. Afinal, segundo o Gabriel Ferreira, “não temos que ter nenhuma síndrome de vira-lata, somos tão bons quanto todos os outros profissionais no mundo”, finaliza Ferreira. 

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Pamela Sousa

Redatora no IT Forum, é graduada em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Maria, RS. Com 2 anos de experiência em produção de conteúdo, concentra-se na elaboração de reportagens e artigos jornalísticos.

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