Um ano para investir em startups lideradas por mulheres
Com investimentos prometendo ser mais conservadores em 2023, empresas com foco em linhas do ESG devem sair à frente
O ano de 2023 promete ser um ano desafiador para as startups que buscam captação de recursos. Segundo dados do Distrito, em janeiro deste ano as startups brasileiras levantaram US$ 96 milhões, uma queda de 84% no volume de aportes quando comparado com o mesmo período de 2022. O número de deals também foi mais enxuto. Em janeiro, foram 25 contra 117 no mesmo mês de 2022. Na visão de especialistas que acompanham o mercado de startups, as incertezas no cenário global e demissões em massa no setor de tech refletem também na disposição de capital para as startups.
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O contexto também pode impactar o empreendedorismo feminino e as startups lideradas por mulheres que, proporcionalmente, são menos numerosas no País. Se de um lado existe uma lacuna de gênero entre os fundadores de startups, do outro lado há também entre os investidores. Pesquisa “Ecossistema de Venture Capital e Private Equity na América Latina”, da Endeavor, feita em parceria com a Glisco Partners, constatou que entre 120 sócios de fundos de investimento que aplicam na América Latina, menos de um quarto dos gestores (22%) são mulheres.
Trago esses dados, pois fundos de investimento pouco diversos também tendem a influenciar as escolhas das startups investidas. Assim, podemos correr o risco de continuar perpetuando a falta de equidade em uma indústria majoritariamente masculina e branca.
Sabemos que a lacuna de diversidade no ecossistema de startups é um reflexo estrutural da sociedade e do mercado de tecnologia e de negócios como um todo. Apesar de uma tímida evolução nos últimos anos, a presença feminina em cargos de lideranças ainda é reduzida. Um estudo da B3 indica que das 408 companhias de capital aberto no Brasil, 61% não tem uma única mulher na alta direção e 45% não tem participação feminina no conselho de administração. Em minha recente viagem à Nova Zelândia, conversando com mulheres empreendedoras com experiências na Ásia e nos Estados Unidos, pude confirmar que essa realidade se aplica em outras regiões, ainda que em proporções mais ou menos diferentes.
Entre as unicórnios, startups avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares, apenas 6% das equipes têm fundadoras. Outro estudo, o Female Founders Report 2021, feito pelo Distrito, Endeavor e B2Mamy, indica que no Brasil apenas 4,7% das startups foram fundadas exclusivamente por mulheres, quase 20 vezes a menos do que aquelas só com fundadores homens.
Por isso, um olhar intencional para o setor é necessário quando se trata de direcionar investimentos. Nesse sentido vemos algumas iniciativas que nascem já com a missão de apoiar negócios liderados por mulheres. A Microsoft lançou em 2019 o Women Entrepreneurship – We Ventures, um fundo dedicado a oferecer investimentos, mentorias e consultorias para startups lideradas por mulheres. As startups Pack ID, Mobees, Smarkets e We Impact receberam aportes do fundo.
A Nasdaq adotou em agosto de 2021 regras que estipulam que os conselhos de administração das empresas listadas na bolsa deverão conter, no mínimo, duas pessoas diversas. Uma delas deve ser uma mulher e a outra deve se identificar dentro de outros grupos vulneráveis, como pessoas negras ou comunidade LGBTIQ+. A inclusão é vista como uma nova forma de fazer negócios.
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Estudos apontam que empresas diversas são mais inovadores e, consequentemente, mais lucrativas. A diversidade de pensamento e diferentes perspectivas contribuem com empresas mais adaptáveis e competitivas. A representatividade também puxa a diversidade. Um dado trazido pela Microsoft aponta isso: startups com pelo menos uma fundadora contratam 2,5 vezes mais mulheres que startups fundadas por homens.
Em um ano desafiador para o setor de tech, é preciso ter ainda mais atenção às iniciativas que carregam a diversidade em seu DNA. Vale ressaltar que, em meio a ascensão da importância do ESG para a reputação das marcas, essa representatividade também promete influenciar a escolha dos investimentos, o que gera também oportunidades. As startups que buscarem mais diversidade, seja em seu quadro societário, de colaboradores e também de objetivos e métricas, estarão alinhadas com propósitos que vão orientar um futuro mais inclusivo.
*Jacqueline Nakamura é uma experiente profissional de Diplomacia comercial internacional com mais de 15 anos trabalhando para diferentes governos estrangeiros na América Latina. Depois de seis anos atuando no Departamento de Comércio Internacional do Reino Unido, liderando tanto as exportações comerciais quanto investimento estrangeiro, Jacqueline assumiu o cargo de Comissária de Negócios para a New Zealand Trade and Enterprise para o Brasil e Mercosur. Com experiência na indústria de tecnologia, trabalhando para empresas multinacionais de tecnologia e associações setoriais de comércio, ela lidera o plano de tecnologia da Nova Zelândia na América Latina. Sua formação acadêmica inclui bacharelado em Relações Internacionais pela PUC-SP e mestrado em economia empresarial pela FGV-SP com Recomendação de Honra.