A expansão do novo coronavírus (Covid-19) vem gerando esforços das empresas para contribuir com os recursos disponíveis de forma a mitigar o contágio de pessoas. E quando se fala no mercado de tecnologia, muitas vezes a contribuição vem do uso de dados dos usuários para, com base em suas movimentações, entender quais regiões precisam de maior atuação do governo e departamento de saúde.
Dentre das iniciativas de empresas pode-se destacar o exemplo da Verily, subsidiária da Alphabet que lançou um site de triagem, onde os usuários inserem dados do histórico médico para entender a probabilidade de estarem com a doença e, de acordo com a resposta, são orientados a permanecer em casa ou procurar um posto de atendimento.
Outro caso diz respeito ao uso feito por governos e Centros de Controle e Prevenção de Doenças de dados anônimos gerados via localização do celular para mapear onde as ordens de permanência em casa são desobedecidas. Esses dados, em sua maioria, são fornecidos pelas empresas de propaganda, não pelas operadoras de celular.
Ações como essas colocam em dúvida, novamente, a segurança e a privacidade dos dados coletados, pois se as pessoas estão renunciando sua privacidade, a indústria deve agir em uma contrapartida semelhante.
Em reportagem para a CIO Dive, Jena Valdetero, advogada de segurança e privacidade de dados da Bryan Cave Leighton Paisner, acredita que devido às circunstâncias “bizarras” e atípicas, os consumidores estão mais dispostos a abrir mão da segurança de sua privacidade, em prol de um “bem maior”.
Valdetero ressalta que as empresas ligadas à publicidade ou marketing, que dependem de dados do consumidor para personalização, têm a obrigação de ser excessivamente transparentes no momento. A Verily pertence à mesma família do Google, o que aumenta a preocupação em relação à proteção de dados. A organização ainda não respondeu aos pedidos de comentário sobre o assunto.
“Talvez a parte mais difícil de todos que trabalham juntos seja trabalhar com seus usuários e até com seus concorrentes para cooperar”, disse Danny O’Brien, Diretor de Estratégia da Electronic Frontier Foundation, ao CIO Dive.
Por conta do cenário, a situação emergencial consequente do coronavírus abre brechas para que indústrias e governo se beneficiem do relaxamento das exigências de privacidade.
Segundo Valdetero, os dados são anônimos, mas a localização geográfica por meio de telefones celulares permite rastrear o paradeiro de uma pessoa. A reportagem alerta para a possibilidade de uma aplicação da lei de forma discriminatória, uma vez que é possível seguir os telefones celulares a bairros marginalizados e atingir diretamente essa população.
“A liberdade e os direitos civis estão ligados à discriminação e é difícil determinar se os preconceitos humanos surgirão quando as emoções já estiverem em alta”, alerta o texto.
A profissional lembra também que muitos dados são compartilhados em excesso e que isso facilita a apropriação e o desvio do destino original daqueles dados. Se os consumidores consentirem que o governo use dados privados durante uma crise, os limites do uso de dados deverão ser explicitamente descritos, segundo a reportagem:
“Antes de começar a pesquisar em sua loja de dados privados para ver se isso pode ajudar na luta contra a pandemia, lembre-se: essa não é sua área de especialização. E não são seus dados pessoais”, disse O’Brien ao CIO Dive.
“Podemos nos sentir desconfortáveis com o fato de essas coisas acontecerem. Mas nós realmente fomos prejudicados por isso?”, disse Valdetero. A reportagem da CIO Dive reforça que se o consumidor não se sente lesado em um incidente de privacidade, não há ação movida.
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