Onde está Wally? Sua localização é um jogo valioso para o Vale do Silício

Apps populares coletam dados de geolocalização, mas apenas 1 em cada 5 americanos leem políticas de privacidade antes de concordar com elas

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2:29 pm - 31 de março de 2021
geolocalização privacidade

“Location, location, location” – a regra de ouro do mercado imobiliário é também lei na tecnologia. Empresas dos mais variados setores querem (e até precisam) acompanhar os passos de seus usuários para entregar o que prometem, mas a prática aparentemente “inofensiva” pode colocar em risco a autonomia de grupos inteiros.

 

Em janeiro deste ano, a ExpressVPN, companhia especializada em segurança digital, revelou as descobertas de seu último “Digital Security Lab”, um estudo focado na privacidade online. Segundo a análise da companhia, quase 70 aplicativos populares de namoros e mídias sociais utilizam rastreadores – o que é bastante compreensível, visto que muitos deles fazer da geolocalização dos usuários parte central da experiência. O problema é que nem sempre fica claro com quais outras companhias essas informações são compartilhadas, nem a extensão do que se pode saber sobre alguém apenas mapeando seus passos.

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“Não é preciso seguir alguém por muito tempo para saber sobre ela. Em questão de horas ou dias eu posso, por exemplo, saber onde você mora, com quem se relaciona e até colher informações sobre seus hobbies, afiliação política, orientação sexual e classe social”, explica ao IT Forum o pesquisador da ExpressVPN, Sean O’Brien.

Ainda segundo o especialista, dados sensíveis colhidos por esses quase 70 aplicativos foram baixados 52 milhões de vezes no período da pesquisa. “Esses dados são valiosos para uma série de serviços”, explica, “muitos são usados para anúncios direcionados, mas frequentemente podem cair nas mãos de cibercriminosos, de organizações militares e agências políticas”.

Vale relembrar aqui o escândalo da Cambridge Analytica, que usou dados sensíveis de usuários do Facebook e outras redes para interferir na democracia de diferentes países, sobretudo nos Estados Unidos. O caso virou documentário e ganhou repercussão no mundo todo, dando início a uma série de discussões mais profundas sobre privacidade na internet.

Foi a partir dessa agitação social que a Apple decidiu mudar sua política de funcionamento e entregar aos usuários do IOS 14 a decisão de se permitir seguir ou não por aplicativos como o Facebook. A decisão da gigante controlada por Tim Cook atingiu o calcanhar de Aquiles do império de Mark Zuckerberg, que estudou processar a Apple.

“A tecnologia não precisa de uma grande quantidade de dados pessoais, agrupados em dezenas de sites e aplicativos, para ter sucesso”, disse Cook em seu keynote no final do ano passado. “A publicidade existiu e prosperou por décadas sem esses dados. E estamos aqui hoje porque o caminho de menor resistência raramente é o caminho da sabedoria. Se uma empresa é construída na base da enganação, na exploração de dados, em escolhas que não são nenhuma escolha, então ela não merece nosso elogio. Ele merece reforma”, finalizou, irredutível.

Depois de criticar abertamente a postura da Apple, Zuckerberg voltou atrás na semana passada, em uma participação no novo aplicativo social Clubhouse. “É possível que sejamos fortalecidos pelas mudanças promovidas pela Apple, porque ela pode encorajar as empresas a negociar diretamente com as nossas plataformas, já que ficou difícil usar dados da Apple para encontrar e dialogar com os clientes que gostariam”, afirmou o americano.

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Enquanto o braço de ferro entre as gigantes do Vale do Silício se desenrola em praça pública, ainda sem impacto dimensionado, a ExpressVPN lembra que nem sempre o bloqueio de Apple ou Google é suficiente para garantir a segurança do usuário. O aplicativo X-Mode, por exemplo, foi banido de ambas a App Store e Google Play, mas continua presente em pelo menos 180 apps monitorados pela pesquisa. “O X-Mode foi banido justamente por coletar dados de localização e compartilhá-los com terceiros”, conta O’Brien.

De acordo com o pesquisador, a pauta de segurança e privacidade tem avançado nos tribunais e na sociedade, mas é importante que os usuários também busquem se educar sobre o assunto. “A primeira coisa que digo às pessoas é que não se apressem a baixar qualquer aplicativo; que elas tomem seu tempo para verificar se aquele app corresponde à realidade, já que diversos aplicativos fraudulentos replicam o nome e a estética de outros famosos”, e conclui, “e, por fim, acho importante apagar do aparelho celular todos os aplicativos que não são necessários e, de fato, utilizados”.

Apesar dos avisos e dicas dos especialistas, uma pesquisa conduzida pela Pew Research identificou que 6 a cada 10 americanos sequer acha possível viver uma vida digital ativa sem ter seus dados coletados. Cerca de 80% dos entrevistados afirmaram ainda que sentem que não têm controle algum sobre suas informações pessoais que são coletadas por companhias e governos.

Contraditoriamente, 97% dos americanos que participaram da pesquisa confirmaram que eles já foram convocados a aprovar políticas de privacidade de empresas e aplicativos, mas apenas 1 em cada 5 adultos disseram sempre ler as regras, enquanto 36% dos participantes confessaram nunca ler as políticas de privacidade antes de concordar com elas.

 

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