Direito ao esquecimento não se aplica no Brasil, decide STF

Na avaliação da Corte, instituto jurídico poderia colocar em risco a liberdade de expressão

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1:52 pm - 12 de fevereiro de 2021
stf Divulgação/Nelson Jr./SCO/STF

Por decisão majoritária, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu nesta quinta-feira (11) que é incompatível com a Constituição Federal o chamado direito ao esquecimento.

A rejeição foi por nove votos a um. Edson Fachin foi o único a se posicionar favoravelmente. Luís Roberto Barroso não votou ao se declarar impedido para analisar o tema.

A avaliação da Corte foi de que a exposição pública de um fato antigo, em respeito à privacidade e à intimidade da pessoa envolvida, não pode ser proibida. A justificativa é que o dispositivo poderia colocar em risco a liberdade de expressão.

“Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso”, definiu a Corte. “A partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível.”

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A decisão veio após o tribunal negar provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 1010606, em que familiares da vítima de um crime de grande repercussão nos anos 1950 no Rio de Janeiro buscavam reparação pela reconstituição do caso, em 2004, no programa Linha Direta, da TV Globo, sem a sua autorização.

Em seu voto, Cármen Lúcia afirmou que não há como extrair do sistema jurídico brasileiro o esquecimento como direito fundamental limitador da liberdade de expressão. Para a ministra, não é possível, do ponto de vista jurídico, que uma geração negue à próxima o direito de saber a sua história.

“Quem vai saber da escravidão, da violência contra mulher, contra índios, contra gays, senão pelo relato e pela exibição de exemplos específicos para comprovar a existência da agressão, da tortura e do feminicídio?”, questionou.

O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a liberdade de expressão é um direito de “capital importância”, ligado ao exercício das franquias democráticas. No seu entendimento, é preciso ponderar valores caso a caso, avaliando quando a liberdade de expressão ou o direito de personalidade deve ter prevalência.

Gilmar Mendes votou pelo parcial provimento do RE, acompanhando a divergência apresentada pelo ministro Nunes Marques.

Com fundamento nos direitos à intimidade e à vida privada, Mendes entendeu que a exposição humilhante ou vexatória de dados, da imagem e do nome de pessoas (autor e vítima) é indenizável, ainda que haja interesse público, histórico e social, devendo o tribunal de origem apreciar o pedido de indenização.

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O ministro concluiu que, na hipótese de conflito entre normas constitucionais de igual hierarquia, como no caso, é necessário examinar de forma pontual qual deles deve prevalecer para fins de direito de resposta e indenização, sem prejuízo de outros instrumentos a serem aprovados pelo Legislativo.

O ministro Marco Aurélio também seguiu o relator. A seu ver, o artigo 220 da Constituição Federal, que assegura a livre manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação, está inserido em um capítulo que sinaliza a proteção de direitos. “Não cabe passar a borracha e partir para um verdadeiro obscurantismo e um retrocesso em termos de ares democráticos”, avaliou. Segundo o ministro, os veículos de comunicação têm o dever de retratar o ocorrido. Por essa razão, ele entendeu que decisões do juízo de origem e do órgão revisor não merecem censura, uma vez que a emissora não cometeu ato ilícito.

Por fim, para ministro Luiz Fux, presidente do STF, é inegável que o direito ao esquecimento é uma decorrência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana, e, quando há confronto entre valores constitucionais, é preciso eleger a prevalência de um deles.

Para o ministro, o direito ao esquecimento pode ser aplicado. Mas, no caso dos autos, ele observou que os fatos são notórios e assumiram domínio público, tendo sido retratados não apenas no programa televisivo, mas em livros, revistas e jornais. Por esse motivo, ele acompanhou o relator pelo desprovimento do recurso.

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