Compliance além das regras
A era digital mudou completamente os paradigmas de negócios do mundo corporativo, criando desafios orientados às demandas dos clientes
Temos uma nova ordem de mercado que exige geração de valor por meio de ativos intangíveis, como a capacidade das organizações de ter olhar atento às mudanças de comportamento para antever anseios e necessidades de uma sociedade cada vez mais conectada.
A frase“os dados são o novo petróleo” ( ‘data is the new oil’) resume bem essa relação das corporações com o desenvolvimento tecnológico. Atualmente, os negócios são motivados pelo “refinamento” e principalmente o entendimento de um quase imensurável volume de dados provenientes de bilhões de dispositivos conectados e que alimentam projetos de inteligência artificial (IA) e ‘machine learning’ formando um ambiente extremamente dinâmico e volátil. Esse cenário tem exigido cada vez mais processos de identificação, mensuração e gerenciamento de riscos e de conformidades pautados na visão de futuro.
Nesse contexto, a tecnologia assumiu também um novo papel. Se antes era vista como ferramenta de investimento de capital, hoje, ela é caminho alavancador de negócios em todos os setores da economia.
Toda organização, seja ela de qualquer porte e pertencente a qualquer segmento de mercado, utiliza recursos tecnológicos em suas operações em prol da otimização de custos, ganhos de eficiência e produtividade, geração de receitas e longevidade das operações. Isso se comprova pelo aumento dos gastos com TI no País no último ano, apontado em 9,8% pela empresa de pesquisas de mercado IDC. Ou seja, a jornada de transformação digital nas companhias é constante – mas esse processo traz desafios diários para aquelas que desejam se manter na vanguarda das inovações.
Mudança de ‘mindset’
As transformações nos hábitos de compras dos consumidores e empresas fez com que a marca assumisse um papel cada vez mais importante na construção de confiança, transparência e lealdade para geração de novos negócios. É preciso considerar que crises reputacionais podem e vão reduzir o valor das ações ou até mesmo levar empresas à falência. No ambiente digital, a proteção de dados se tornou ameaça à reputação.
Nos últimos dois anos, no Brasil e ao redor do mundo, acompanhamos casos de grandes marcas e empresas que tiveram seus nomes manchados por vazamento de dados. O Facebook, por exemplo, encerrou 2018 com US$ 17,2 bilhões (R$ 64,1 bilhões) a menos em seu valor de mercado, por conta das falhas na manutenção da privacidade dos dados de milhões de seus usuários.
Além disso, medidas estratégicas, como a recente decisão da Câmara dos Deputados em aprovar a MP que cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados na LGPD, por exemplo, reforçam a ideia de que a segurança cibernética será o ‘must have’ para os próximos anos. O tema deverá pautar tomadas de decisões que definam e garantam boa reputação, de acordo com a nova dinâmica social, e com isso aumentem os retornos financeiros das empresas, para também evitar perdas milionárias em caso de vazamento de dados confidenciais.
Como se adaptar
Com mudanças constantes da sociedade e com o cliente assumindo o poder decisor de disrupções, os desafios para se adequar ao novo ambiente de negócios são diversos. A boa notícia é que há um caminho seguro que leva à luz no fim do túnel. Certamente a revisão do programa de compliance é o primeiro passo para formalizar processos e implementar ações de conformidade nas empresas. Atualizar regras e normas de conduta internas e externas é uma etapa essencial, mas não isolada.
O segundo passo é criar ou manter um perfil inovador. Cabe ao conselho de administração e ao CEO a responsabilidade de pensar de forma estratégica no futuro e trazer pessoas com pensamento digital, para definir, de forma ágil e tempestiva, os caminhos a seguir dentro das possibilidades disruptivas que a nova economia apresenta.
O terceiro e importante passo é mapear, conhecer e quantificar seus riscos cibernéticos, por meio de um diagnóstico detalhado e elaborado com auxílio de software específico e soluções tecnológicas. Esse diagnóstico deve ser baseado em modelos analíticos que avaliam o possível impacto financeiro das ameaças digitais, traduzindo métricas de segurança cibernética em métricas de negócios.
Vislumbrando o futuro
O olhar atento a esses pontos ajuda a definir e aplicar mudanças de rota necessárias. É preciso ter em mente a importância de estar atento às demandas e percepções de funcionários, clientes, parceiros e outros públicos para entender, de fato, para onde vai a necessidade dos clientes por produtos e serviços.
A partir dessa observação e com base em outros mecanismos de inteligência de negócios, a empresa desenvolve capacidade de antecipar e medir o impacto de riscos além das normas pré-estabelecidas nos documentos de gestão. A mudança de visão será fator diferenciador e decisivo nessa nova ordem econômica na qual prever o futuro (ou pelo menos tentar) já é parte do jogo.
*Mauricio Cataneo é vice-presidente e CFO da Unisys na América Latina. Membro do Conselho de Administração e Chairman do Comitê de Ética da Brasscom