Na presidência da Totvs, Dennis Herszkowicz busca caminho próprio
Um ano e meio após assumir a vaga ocupada, até então, por Laércio Cosentino, novo CEO conquista saldo positivo para 'totvers' e acionistas
Dennis Herszkowicz teve pouco tempo para respirar entre a empresa que deixava, a Linx, após uma sólida trajetória de 15 anos, para assumir não só um grande cargo como também um lugar simbólico na nova companhia que o contratava: o da presidência da Totvs, ocupado até então pelo seu fundador, Laércio Cosentino.
Era novembro de 2018. Cerca de um ano e meio depois, Herszkowicz evita afirmar que, sim, se trata de uma sucessão bem-sucedida, mas resultados da gigante brasileira de ERP apontam exatamente nessa direção: o lucro da companhia praticamente dobrou e as ações subiram 150% desde a transição. Pelo processo de sucessão da presidência na Totvs, Herszkowicz foi reconhecido como Executivo de TI do Ano 2020 para a Indústria, na categoria Fabricantes de Hardware e Software. O prêmio é concedido pela IT Mídia em parceria com a Korn Ferry.
“O Laércio é uma lenda no mercado de tecnologia. Não tem ninguém como ele com uma história e conquistas no segmento e isso por si só é uma grande tarefa”, avalia. “Para além da sucessão, também tenho um mandato para fazer com que a Totvs recupere o vigor do ponto de vista do crescimento, com uma estratégia de alto nível para os próximos dez, 20 anos”, complementa.
Com a entrada de Herszkowicz na Totvs, Cosentino deixa o dia a dia operacional da companhia para assumir a presidência do conselho de administração. Em uma rápida revisão de suas biografias, pode-se afirmar que Herszkowicz e Cosentino mantêm trajetórias semelhantes. Ao longo dos 37 anos de história da Totvs, Cosentino somou mais de 40 aquisições desde a época que comandava a Microsiga. Na rival Linx, Herszkowicz deixou uma reputação também de peso: foram mais de 30 compras quando respondia como CFO e liderava a área de M&A (termo para Mergers & acquisitions).
Na nova casa, Herszkowicz deu sequência às compras. Em 2019, a Totvs adquiriu as empresas Supplier e Consinco, após a companhia ter firmado joint venture com a Vtex, captando R$ 1 bilhão com oferta subsequente de follow-on. Outro marco: a companhia passou a integrar o Ibovespa, sendo a primeira de tecnologia a compor o índice.
Grandes poderes, grandes responsabilidades
Por seu currículo de sucesso, engana-se quem pensa que Herszkowicz tenha raízes acadêmicas em finanças ou administração. “Nunca fiz nenhum MBA”, conta. “Sempre aprendi no dia a dia no trabalho”. Herszkowicz é formado em Propaganda e Marketing pela ESPM. “Eu brincava na Linx que eu era, provavelmente, o único CFO formado em Marketing a conseguir entrar na Bovespa”, lembra. O executivo foi responsável por conduzir o IPO da Linx em 2013. Em 2017, assumiu como vice-presidente-executivo para Novos Mercados.
Um dos desafios que o novo CEO da Totvs tem diz respeito ao ciclo de M&A que vem pela frente. A estratégia, segundo ele, envolve algumas frentes prioritárias, sendo a principal delas aquisições que defendem e reforçam o core business da companhia que são softwares de gestão. Ao mesmo tempo, quando a Totvs começou a se posicionar para o mercado como uma empresa techfin, no ano passado, a empresa busca se alinhar com um mercado efervescente na América Latina: o de serviços financeiros.
“O maior desafio quando se cria um novo mercado, como o de techfin, por exemplo, é o de não perder atenção ao que é o coração do negócio que, no nosso caso continua sendo software”, analisa Herszkowicz. Para ele, o desafio é encontrar esse equilíbrio entre a capacidade de execução de um novo mercado, “sem perder o vigor e atenção ao core que nos trouxe até aqui”.
As aquisições da Supplier e Consinco são apenas as primeiras de uma leva. Segundo o CEO, o ciclo seguindo o follow on é previsto para dois a três anos. “Temos recursos”, pontua. “É fácil dar tiro para muito lado e dispersar energia e recursos em mais projetos do que você tem condição de executar”, afirma.
Esse direcionamento diz muito a respeito da decisão de a Totvs vender a Bematech, empresa cujo negócio central eram impressoras de cupom fiscal, além de uma divisão de software voltado para pequenos varejistas. Em 2015, a TOTVS comprou a companhia por R$ 550 milhões. Em 2019, a vendeu por R$ 25 milhões para a Elgin. A unidade de software da Bematech ainda ficou sob o seu chapéu.
A venda da Bematech era questão de tempo, sugere Herszkowicz. “É aquilo, quando você vem de fora, fica mais fácil executar a decisão. Cheguei no final de novembro e a venda se deu em abri., Foi uma execução proporcionalmente rápida, mas não se consegue fazer isso sem um consenso na administração, na diretoria. Esse era um caminho estratégico a seguir, não ter mais o hardware”, diz Herszkowicz.
“Não vou calçar os sapatos do Laércio”
Ao assumir a presidência da Totvs, Herszkowicz sabe que também lida com as expectativas que rondam o seu papel. A curiosidade do mercado soa inevitável. “Me lembro bem, no primeiro encontro com os acionistas, eles fizeram a pergunta ‘como é calçar os sapatos do Laércio?'”, recorda. “A minha resposta foi muito natural. Não acho que estou calçando os sapatos dele. Isso significa que nunca vou ter a pretensão de ser o fundador da Totvs, de ser a figura lendária que ele é neste mercado. É uma condição dele. Todo dia procuro construir a minha história, o meu caminho. Não preciso ser igual ao que ele foi e o inverso também é verdadeiro. Cada situação tem de ser avaliada a cada momento. O caminho é uma referência e não uma obrigação”, salienta Herszkowicz.
Desde que deixou a presidência da Totvs, Cosentino não participa da rotina diária da empresa, mas a comunicação, diz Herszkowicz, é diária. O executivo, neste momento, reconhece que se há preparação da sua parte para a sucessão da Totvs, também houve da parte de Cosentino fazer o mesmo. “Abrir mão da posição de presidente da Totvs não é algo simples. Muitas vezes me coloco no lugar dele. Uma empresa é quase como um filho. Passar o bastão não deve ser fácil e percebo que ele fez um trabalho muito profundo, um trabalho mental mesmo que permitiu a ele ter tranquilidade nesse um ano e meio e que tem me ajudado muito”, conta Herszkowicz.
Liderança requer dar um passo para trás
Para além das expectativas do mercado, o processo de sucessão de uma presidência também cobra algo mais sensível e diz respeito a estabilidade e segurança dos funcionários. Afinal, a chegada de Herszkowicz à Totvs poderia significar grandes rupturas na cultura corporativa e no quadro de colaboradores.
“Poderia chegar aqui, ver a performance da Totvs dos anos anteriores, que não foi brilhante do ponto de vista financeiro, e achar que tudo estava sendo feito errado e mudar tudo”, conta. “Não foi o que eu fiz. Tive a tranquilidade de ouvir todo mundo, me aprofundar nas questões, conhecer cada pessoa do time, dos diretores, dar tempo ao tempo e acho que isso me ajudou a conquistar o time. A matéria–prima da Totvs é gente e se você não construir essa cumplicidade e confiança, as coisas não vão andar do jeito que podem andar.“
O papel de CEO, no final do dia, pode ser solitário, mas é uma condição que deve ser evitada. “Muitas vezes, as pessoas acham que é o cara que tem visão de alcance e todas as respostas, mas não é verdade”, indica.
Com cerca de 7 mil colaboradores ou como são chamados, os “totvers”, a complexidade da empresa que Laércio Consentino fundou pode se escalar se não for alinhada à uma cultura própria e defendida pela companhia. “Não vou ter todas as respostas. Tenho capacidade de trazer as melhores pessoas, rever e dar o ambiente de autonomia e tranquilidade para que as pessoas produzam no máximo delas, porque, a maior parte das respostas virá delas”, conclui Herszkowicz.
Finalistas do prêmio Executivo de TI do Ano 2020, na categoria Fabricantes de Hardware e Software
1º Dennis Herszkowicz, Totvs
2º Dennison John, SAP Labs Latin America
3º Cassio Pantaleoni, SAS