Publicidade inclusiva: qual o papel das lideranças?

O alto comando das empresas de marketing deve utilizar a tecnologia como aliada da diversidade através da publicidade inclusiva

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10:00 am - 16 de janeiro de 2024

Quando falamos de publicidade inclusiva a primeira coisa que vem à mente são campanhas de marketing que retratam pessoas sem estereótipos sociais ou culturais. Tudo muito bem construído para atingir vários perfis de consumidores que, geralmente, não se sentem representados pelas peças publicitárias tradicionais.

É assustador admitir que a diversidade na publicidade está retrocedendo. Isso foi comprovado pela 11° edição da pesquisa “Representa”, realizada pela ONU Mulheres em parceria com a Aliança #SEM ESTEREÓTIPOS, em 2023. Foram analisadas 7.402 peças publicitárias coletadas em outubro de 2022 e os números não são animadores: há 4 vezes mais mulheres brancas (78%) do que mulheres negras (18%) sendo representadas na publicidade transmitida pela televisão. Pior, o percentual de homens negros como protagonistas na TV está estagnado na casa dos 20%, enquanto o protagonismo branco passa dos 72%.

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O problema é que esses dados não condizem com a realidade no Brasil, onde 56% do total da população brasileira se autodeclarou preta e parda, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), publicada em 2022 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Como a população negra vai se identificar com os produtos se eles não são o público-alvo da indústria da publicidade?

A maneira de contornar essa situação é reformulando a publicidade para entregar peças e mensagens que realmente falem com o receptor. Assim, os anúncios se tornam um diálogo com o público, diferente do que acontece nas propagandas tradicionais, onde o receptor recebe mensagens genéricas e acaba se adequando à elas ao invés de se identificar com o que está consumindo. Seu público não vai criar um vínculo com a sua marca se ele não se enxergar nela. Passou-se o tempo que os produtos eram comprados apenas porque eram bons, agora eles precisam fazer parte da vida dos clientes. A grande questão é: como fazer uma publicidade inclusiva?

Olhando para dentro de casa

O primeiro passo para o líder romper com a barreira do estereótipo é estar verdadeiramente aberto a trabalhar com a diversidade e inclusão dentro da sua empresa. Como você espera ser capaz de produzir um anúncio direcionado para mulheres, por exemplo, se sua equipe de marketing é composta apenas por homens entre 20 e 35 anos? Eles podem até tentar, mas nunca vão entender totalmente a realidade desse público, suas preocupações e o que elas realmente precisam. Isso pode acarretar em uma propaganda que não é fiel a realidade delas, como é o caso dos anúncios de absorventes – ninguém fica tão feliz assim por ter que usar um absorvente. Não compreender totalmente essas dores não torna os profissionais menos capacitados, só nos mostra a importância de ter uma equipe de marketing diversificada.

Não fazem muitos anos desde que o mercado publicitário começou a valorizar temas como a pluralidade e a inclusão social, tanto nas campanhas, quanto nos times; mas isso ainda não é o suficiente. De acordo com o censo da ODP (Observatório da Diversidade na Propaganda), falta diversidade dentro dos times das agências publicitárias. Dentro da amostra de 28 agências e 13 CEO’s, 68% das equipes são formadas por pessoas brancas, 21% por mulheres negras, 24% por membros da comunidade LGBTQIA+, 5% por profissionais +50 e 1,6% por pessoas com deficiência.

No alto comando, a disparidade é ainda maior. Pessoas brancas representam 92% dos CEO’s e 88% dos cargos de liderança, enquanto mulheres pretas e pessoas com deficiência representam, respectivamente, 4,6% e 0,7% das mesmas funções, e nenhuma dessas categorias atua como CEO. Nas empresas entrevistadas, 16,2% dos cargos de liderança são ocupados por colaboradores LGBTQIA + e 6% pelo público sênior; já no posto de CEO, 23% são profissionais +50 e 8% são da comunidade LGBTQIA +.

Um dos motivos que explica esse cenário é que para muitos gestores não é preciso inovar desde que o tradicional dê lucro, e isso atrasou o desenvolvimento do mercado publicitário. Afinal, do que adianta montar uma equipe de marketing renomada se ela não pode pensar fora da caixa e desenvolver publicidades mais inclusivas?

Tecnologia como aliada

Para que esse cenário mude, as lideranças precisam apoiar as causas e garantir os recursos apropriados para fazer as campanhas acontecerem. O mesmo estudo do Gartner ainda afirma que, para quase 60% das organizações, o maior desafio é colocar sobre o líder a responsabilidade de abraçar a diversidade e a inclusão. Isso só prova como a mudança de mentalidade precisa vir de cima.

Os líderes também são responsáveis por criar um ambiente de trabalho saudável que estimule o desenvolvimento dos times e dos projetos diversos e inclusivos. A liderança é o reflexo da marca, ela deve personificar e transmitir os valores da empresa tanto para os colaboradores quanto para stakeholders e clientes. Além disso, é por meio desses princípios que percebemos se o que as organizações pregam nas campanhas também está presente no seu dia a dia.

Além da mudança de pensamento, as marcas precisam entender como usar os dados para personalizar suas campanhas e torná-las mais inclusivas. A tecnologia é uma grande facilitadora desse processo, pois permite que as equipes mapeiem seu público-alvo sem ficarem presas aos estereótipos. Um grupo com a mesma faixa etária e que mora na mesma região não precisa ter, necessariamente, os mesmos gostos, e isso reflete no nível de aceitação do anúncio; as organizações que perceberam isso já estão anos luz no que diz respeito à inclusão.

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Quer um exemplo? Um homem pode ser homossexual e ainda sim ser fanático por futebol. Para ele, é muito interessante ser impactado por um anúncio sobre camisetas de time de futebol em promoção, mas ele também quer se sentir representado assistindo uma propaganda de Natal que é estrelada por uma família composta por dois homens. Uma categoria não exclui a outra, e ele deve ter acesso aos dois conteúdos.

Como vimos, a tecnologia é, sem dúvidas, a maior aliada da indústria de publicidade. Sem ela, como seria possível descobrir qual dos integrantes em uma casa de seis pessoas, por exemplo, se interessa mais por futebol? Com esse detalhamento, os anúncios se tornam hiper personalizados e o nível de rejeição da mensagem é menor.

Vou dar outro exemplo. Vamos imaginar que nesta mesma casa um dos moradores tenha deficiência auditiva, qual seria o impacto de uma comunicação oral sobre essa pessoa? Provavelmente nenhum. Por isso, voltamos à importância de contar com um time de marketing inclusivo. Se uma das pessoas desse time também tem baixa audição, ela poderia sugerir que a propaganda contasse com uma tradução simultânea ou com um intérprete de libras para que os consumidores com deficiência auditiva pudessem entender o anúncio.

É por isso que o papel das lideranças de marketing é compreender que a diversidade se constrói de dentro para fora da organização. Na prática, estimular a inclusão significa dar oportunidades para que todos os públicos possam ser representados pela publicidade. A hora de agir é agora.

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