WhatsApp versus Justiça: “queda de braço” parece não ter fim

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1:03 pm - 28 de setembro de 2016
WhatsApp versus Justiça: “queda de braço” parece não ter fim

De um lado, a comunicação, a liberdade de escolhas e o gosto popular. Do outro, a eficiência e a segurança do Estado nas buscas para investigações criminais. No meio do caminho, a falta de acordo entre os responsáveis de cada lado: o Facebook, responsável pelo WhatsApp, principal aplicativo de compartilhamento de mensagens em funcionamento no Brasil, e autoridades judiciais e policiais brasileiras. A discussão em questão é a privacidade versus segurança e a “queda de braço” parece estar longe do fim.

Dois casos recentes de bloqueio do aplicativo WhatsApp, a pedido da Justiça nacional, causaram polêmica e evidenciaram o cenário de desavenças entre as duas partes. Os bloqueios do aplicativo foram impostos após a empresa norte-americana recusar o pedido de quebra de sigilo de suspeitos de uma investigação. O período sem o aplicativo causou clamor popular e mostrou o quanto o WhatsApp caiu nas graças dos brasileiros.

Algumas autoridades judiciais e policiais estão declarando claramente suas posições críticas contra as atitudes da empresa norte-americana. Foi o que aconteceu durante o II Congresso Internacional de Direito Digital, realizado na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Um dos painéis, que tinha o objetivo de discutir os aspectos legais nos bloqueios do aplicativo, evidenciou a falta de sintonia entre as partes.

O debate contou com a participação de Cristina Sleiman, professora de pós-graduação em direito digital e compliance da Faculdade Damásio; Ivana David, Juíza substituta de 2º grau do TJ-SP;  Paulo Marco Ferreira Lima, Procurador de Justiça Estadual e coordenador do Núcleo de Crimes Cibernéticos do Ministério Público; Carlos Eduardo Sobral e Luiz Roberto Ungaretti de Godoy, Delegados da Polícia Federal; José Mariano de Araújo Filho, Delegado de Polícia do Departamento de Inteligência da Polícia Civil;  Marcos Tupinambá Pereira, professor de investigação de crimes digitais da Academia de Polícia do Estado de São Paulo; Filipe Vilicic, editor da Revista Veja; e Eduardo Oliva, consultor da Nurnberg Messe Brasil.

O principal questionamento das autoridades policiais e judiciais presentes foi o limite que uma empresa estrangeira pode chegar ao infringir leis nacionais justificando seu procedimento padrão. A posição dos envolvidos é que a soberania do Estado deve sempre existir, não importa qual seja a companhia em questão. A opinião deles é que o Facebook, por meio do WhatsApp, precisa seguir a lei vigente brasileira e permitir o acesso aos dados para investigações criminais. O que aconteceu nos últimos casos foi que a empresa seguiu norma dos Estados Unidos, que não permite divulgação de dados para fora do país.

O WhatsApp informou, por meio de nota, que “dá grande importância a questões de justiça e por isso mantém um canal dedicado para tais solicitações. Cooperamos tanto quanto possível com pedidos da justiça brasileira, dada a arquitetura do nosso serviço. Nosso serviço é projetado de tal forma que uma vez que as mensagens são entregues aos usuários, elas não ficam armazenadas nos nossos servidores, o que nos permite proporcionar às pessoas uma experiência mais rápida e mais confiável”. 

Além disso, prosseguiu o comunicado informando que todas as mensagens são criptografadas ponta a ponta, porque as pessoas costumam enviar informações pessoais ou confidenciais via WhatsApp e “não querem que outras pessoas, inclusive nós, tenham acesso a esse conteúdo. Para o conteúdo criptografado, não temos a capacidade de decifrar as mensagens ou chaves que permitiriam isso”.

“O Estado não tem interesse em espionar a vida alheia. Quando chegamos ao ponto de uma solicitação como essa a uma empresa é porque é realmente necessário. Entendemos que tem o lado emocional envolvido, é um aplicativo que todos gostamos, mas há a necessidade da informação para defender a comunidade”, disse Marcos Tupinambá, que contou também que essas brigas já aconteceram com todas empresas de mídia presentes no Brasil e que com o Facebook está sendo o caso mais difícil.

Ivana David, que foi revisora do primeiro processo que derrubou o WhatsApp, da Justiça de São Bernardo do Campo (SP), explica que, na ocasião, foi revogada a determinação pois foi apresentada impossibilidade técnica de fornecer dados à investigação. “Nossa sociedade tem de decidir o que vale a pena. Nossas escolhas não dependem só de nós. Temos de enfrentar e refletir. A escolha é nossa, como sociedade. Precisamos saber se é isso que queremos para nós”, provocou Ivana.

A suspensão do aplicativo é o que defende o delegado José Mariano de Araújo, caso o problema persista. “O WhatsApp não é serviço considerado essencial e, por isso, poderia pode ser interrompido. Se viola os valores da Constituição Federal, que protege as pessoas, não há o que discutir. Não podemos confundir gosto popular com serviço essencial”, pontuou.

O WhatsApp informou também que possui poucos dados sobre os usuários e que são coletados apenas um número de telefone, um nome opcional (que não é verificado), uma imagem no perfil opcional e informações básicas, como o tipo de dispositivo e quando o usuário está no aplicativo. Essas características do serviço, de acordo com a companhia, o tornam muito diferente de outros serviços que estão no mercado e significa que a empresa normalmente não tem informação úteis para a justiça.

A assessoria de imprensa do Facebook não se posicionou até o fechamento da reportagem.

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