Com 50 projetos usando IA, Grupo Boticário quer manter essência humana

Empresa apresentou projetos de IA durante o Google Cloud Next’ 2023. IA generativa está no radar, mas meta é não substituir interações com clientes

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11:29 am - 01 de setembro de 2023
boticário Imagem: Shutterstock

Cerca de dois anos depois de começar uma jornada para organizar e tirar proveito de uma imensidão de dados de negócio, o Grupo Boticário já tem em torno de 50 projetos envolvendo inteligência artificial (IA). E eles utilizam uma série de variáveis distintas, considerando que esses projetos são tanto de natureza financeira – como prevenção a fraude e precificação – como de previsão de demanda, otimização de portfólio e até apoio na criação de produtos.

“São vários modelos, depende das variáveis”, conta Matheus Garibalde, diretor de produtos de dados e IA do Grupo Boticário, em conversa com jornalistas durante o Next’ 2023, evento do Google Cloud realizado essa semana em São Francisco, nos EUA. O IT Forum participou remotamente. A empresa brasileira de cosméticos utiliza infraestrutura do Google para rodar seus modelos de IA.

“Nossa jornada de dados é recente. Começou em 2021 com mais força. Hoje eu vejo que o Boticário, que era uma empresa data first, virou uma empresa AI first. Queremos estar na vanguarda, então estamos investindo bastante em IA”, ressaltou o executivo.

Essa virada, do ponto de vista técnico, começou quando o Boticário sentiu necessidade de melhorar a forma como coletava e utilizava os dados hospedados no sistema de gestão da SAP. E o conseguiu a partir do uso do framework do Cortex, produto que automatiza a captação de dados do ERP para uso em modelos de IA e machine learning.

“O Cortex resolveu a questão de trazer dados, e agora os nossos engenheiros de dados não tem mais todo esse trabalho de trazer manualmente o que precisavam do ERP, que era algo muito moroso”, contou Philipp Nguyen, diretor executivo de dados do Grupo Boticário, durante a coletiva com jornalistas brasileiros.

Segundo ele, essa mudança na forma de fazer a coleta de dados e os benefícios já colhidos com o projeto permitiu que o Boticário tenha expandido sua equipe de tecnologia e de dados. Eram 200 pessoas em tecnologia em 2019, em um time de TI mais tradicional de suporte a infraestrutura, não produtos digitais.

Agora são 2,8 mil pessoas no time de tecnologia da empresa, com perspectiva de fechar 2023 com 3 mil. O time de dados, que em 2021 tinha 43 funcionários, agora tem 490.

Vertex AI

Segundo Nguyen, essa expansão do time também se deve ao uso da plataforma de modelos de IA do Google Cloud, a Vertex AI, que serve de repositório de modelos mais ou menos prontos para uso pelas corporações. A adoção da nuvem do Google foi uma resposta para a dificuldade que o Boticário tinha para rodar os complexos e pesados modelos de IA.

“A gente estava procurando uma plataforma de ML”, conta o diretor. “Todo nosso stack está sobre ferramentas do Google. Gostamos que o Google usa open source e o cliente não precisa se preocupar em manter funcionando.”

Segundo Garibalde, o Boticário foi um dos primeiros usuários de Vertex AI na América Latina, e um é um dos maiores clientes da empresa na região.

“Antes, quando a gente ia colocar um modelo em produção, tinha que discutir dois ou três meses onde colocar. Colocávamos on premises e ainda tínhamos problema depois. Com essa simplificação, se o modelo for simples a gente coloca [no ar] em um dia. Se for mais complexo em uma semana”, conta o executivo.

Projetos em evolução

Os dois executivos deram detalhes sobre a longa série de projetos de IA que estão rodando atualmente no Boticário. Por exemplo, o modelo de “footprint de lojas” da empresa, que ajuda a definir em que locais serão abertas novas lojas, ou onde outras com resultados ruins podem ser realocadas.

“[O modelo diz] o número ideal de lojas que deveríamos ter. Onde a loja deveria estar, se no bairro X ou Y. Ano passado abrimos três lojas com base nesse modelo e confirmamos que o resultado é real e válido”, contou Garibalde. “E agora temos uma expansão de lojas baseada em dados. Isso ia acontecer antes pelo feeling, mas agora é baseado em dados.”

Segundo os executivos, são 2.700 variáveis consideradas para que o modelo entregue essas respostas. “Achamos 500 regiões potenciais que poderiam ter lojas e a gente não sabia, porque o modelo tem essa visão mais holística. No fundo ele fomentou o debate da abertura de novas lojas que a gente ainda nem estava discutindo”, ressaltou o executivo.

Outros usos curiosos são os feitos pelo “otimizador de portfólios” e o “bureau de tendências”. São modelos que ajudam a equipe de produtos do Boticário a desenvolver cosméticos, ou as lojas e vendedores a sugerirem substituições que façam sentido para consumidor final.

“Ao invés de só fazer testes com base em experimentação empírica, primeiro a gente simula isso usando IA para saber se o produto é estável, vai mudar de cor, para depois fazer os testes exigidos pela Anvisa, mas de forma muito mais assertiva e rápida do que antes”, conta o executivo, que também observou ganhos no “time to market”.

Boticário generativo e fator humano

E não se trata, segundo Nguyen, de simplesmente cortar produtos que vendem pouco. “Tem gente que gosta. Então não é questão de tirar o produto [do portfólio], não é o viés de ‘tudo que não dá muito dinheiro tira’. Somos uma empresa humana”, ressaltou, dizendo que a diretriz atual do grupo é que a IA não substitua o elemento humano na atuação da empresa.

“No geral a gente quer usar IA para melhorar a vida das pessoas e, no fim das contas, oferecer produtos e serviços melhores. E aí você consegue quebrar [esse uso] nas várias áreas [dentro da empresa]”, comenta Nguyen.

O próximo passo na jornada do Boticário com a inteligência artificial é justamente o da IA Generativa. Segundo Garibalde, a empresa já estuda formas de usar o recurso na nuvem do Google, mas o primeiro passo foi entender a tecnologia e definir que cuidados deveriam ser tomados em futuros projetos.

“A primeira coisa que a gente fez não foi sair desenvolvendo, mas sim discutir a tecnologia e se a gente poderia usar os nossos dados internos. Se, por exemplo, a gente que é uma empresa que toma cuidado com o cliente, com uma visão humana, vamos usar uma pessoa gerada por IA? Não”, contou Garibalde.

O executivo adianta que a IA generativa pode servir a aplicações de contato com os clientes, por exemplo, mas ainda há muita experimentação a ser feita. “IA generativa vai dar um boost nisso também, porque faz as relações não pensadas de forma muito mais potente. Mas a gente ainda precisa desenvolver”, disse, ressaltando que, sim, a nova tecnologia “é uma revolução dentro da área de IA pra gente”.

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Marcelo Gimenes Vieira

Editor do IT Forum. Jornalista com 12 anos de experiência nos setores de TI, telecomunicações e saúde, sempre com um viés de negócios e inovação.

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