Walter Longo: no metaverso, é hora de aprender e coletar dados

Para especialista em inovação, apesar de problemas de interoperabilidade e latência, empresas precisam se antecipar e arriscar

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2:15 pm - 14 de junho de 2022
Walter Longo. Foto: Divulgação

É difícil prever se o metaverso não passa de hype passageiro ou uma tendência definitiva, em que todos entrarão cedo ou tarde. Mas, para Walter Longo, já se trata de algo importante, que merece atenção e conhecimento dos profissionais e líderes de tecnologia das empresas. Isso implica em estudar o assunto e “não aguardar”, ou seja, fazer testes e capitanear projetos de inovação que garantam presença caso o metaverso de fato decole.

“E entender que nesse momento não é ROI [retorno sobre o investimento], mas de ROL, com L de Learning. Aprender e coletar dados”, diz em entrevista ao IT Forum o especialista em inovação e transformação digital – e principal atração do Sky.One Connect, evento que ocorre nessa terça (14) em São Paulo, capital.

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Longo é publicitário e administrador de empresas de formação, com pós-graduação na Universidade da Califórnia. Também é palestrante e sócio-diretor da Unimark Comunicação, empresa que lidera – embora seja mais lembrado pelo período em que foi presidente executivo da Editora Abril.

Para ele, para que se firme o metaverso tem dois grandes desafios técnicos. Primeiro a falta de interoperabilidade, o que inviabiliza a transferência de itens e a interação entre os usuários de diferentes plataformas. E, segundo, a latência elevada, que impede interações mais amplas, profundas e massivas.

“Estamos como no início da internet”, lembra o especialista, lembrando os diferentes servidores de correio eletrônico que não conversavam entre si. “Até que surgiu o WWW, um protocolo de linguagem comum.”

Confira a seguir os melhores momentos do bate-papo.

 

IT Forum: Sua palestra no Sky.One Connect diz respeito ao metaverso. O que você pretende apresentar?

Walter Longo: Fiz um estudo recente bastante abrangente sobre consequências sociais e corporativas [do metaverso]. O tema vai ser Metaverso: um dia você vai viver e trabalhar lá.

Nele mostro algumas tendências que já vinham ocorrendo e foram agudizadas pela pandemia e levam a um crescimento natural e exponencial do metaverso.

 

IT Forum: Que tendências?

Longo: Primeiro o costume que todos nós obtivemos, um test drive que tivemos, da presença digital nas redes sociais. Todo mundo quer ser mais alegre e feliz nas redes sociais. E esse foi um treinamento para o metaverso. Segundo que aprendemos a estar longe e perto ao mesmo tempo. Essas ferramentas com que nós estamos aqui conversando [videoconferência], antes era restrita a um grupo menor e agora é [acessível a] toda população. A terceira razão é que a sociedade busca um mundo mais inclusivo, com as mesmas chances e possibilidades.

E [o metaverso] parece uma promessa de mundo mais democrático, inclusive. Tudo isso atrai pessoas de qualquer natureza. No [livro] Snow Crash, o [autor] Neal Stephenson usou o termo pela primeira vez e mostrou que no fundo um entregar de pizza poderia ser um guerreiro. É uma atração irresistível.

 

IT Forum: E quais são as implicações do metaverso para o mundo corporativo?

Longo: As marcas estão desesperadas para assumir sua lavra [no metaverso]. A principal razão é que houve uma mudança do propósito corporativo. Dez ou 15 anos atrás, quando eu ia a um conselho [de administração] e dava uma ideia, o questionamento era se aquilo se encaixava no negócio.

“Vamos focar no nosso negócio, não vamos abrir demais porque foco é fundamental.” Mais recentemente se começou a falar não só em que negócio estamos, mas que problema estamos resolvendo. Isso já tornou o propósito corporativo mais abrangente. Não interessava mais o que eu fazia, e sim o que eu resolvia. Mais recentemente passamos a “que sonhos vamos realizar?”. É uma proposta corporativa ainda mais abrangente, e aí surge o metaverso como essa possibilidade de realizar os sonhos dos clientes. E isso gerou uma corrida impressionante de marcas e produtos indo para o metaverso.

As grifes mais importantes estão fazendo desfiles no metaverso e vendendo roupas, bolsas, calçados. As pessoas estão comprando para ir a uma festa, encontrar amigos por meio de um gêmeo digital. E se por um lado estão lançando produtos incorpóreos, também estão vendendo coisas para o mundo físico. Eu entro numa loja no metaverso, compro um tênis e ele [o vendedor] pergunta se vou querer digital ou físico. É uma grande revolução que está surgindo no varejo.

 

IT Forum: Walter, nossos leitores são principalmente profissionais e líderes de TI que, nesse momento, se perguntam como podem viabilizar essa visão, que é principalmente de marketing.

Longo: Ainda há um grande ponto de interrogação a nossa frente. É o que chamamos de interoperabilidade. São centenas de mundos, cada um com sua criptomoeda, capacidade de eventos, shows, programas, compras etc. Só que ainda não temos a interoperabilidade entre esses vários mundos. Se eu compro uma camiseta do Fortnite ela não vai para o Roblox.

Estamos como no início da internet, com as mesmas fragilidades daquela época. Se eu mandava um e-mail para um colega de faculdade, ele não podia ser recebido em uma empresa. Até que surgiu o WWW, um protocolo de linguagem comum. O que está nesse momento sob judice é qual será a velocidade da interoperabilidade implementada, qual a linguagem, o modelo etc. Alguns mundos estão criando APIs para outros mundos. Tenho visto ferramentas de construção de avatares que permitem que aquela roupa vá para três ou quatro mundos. Mas ainda são exercícios iniciais.

Outro assunto é latência. Isso incomoda muito quem é de TI. Ainda temos limitações. Se faço um show para um milhão de pessoas é possível, mas 40 ou 50 ainda não podem olhar uma para a outra. E vem aí o 5G para resolver esse problema. Esses dois desafios acredito que são os dois que estão no momento sendo resolvidos.

 

IT Forum: De alguma forma esses dois problemas podem impedir a evolução do metaverso? Ele pode simplesmente não decolar?

Longo: A resposta é que pode acontecer. Mas tem algumas diferenças fundamentais para experiências anteriores como o Second Life, por exemplo. Você entrava com um boneco tosco que não era você, mas que representava você. Ele passava por outras pessoas fazendo um balãozinho, ou seja, não tinha nada para fazer. Depois de 40 minutos você ia embora. Hoje é muito diferente. Eu comprei um terreno no Upland [plataforma de metaverso baseado em NFTs]. Montei minha casa. Depois aluguei. Agora recebo aluguel. Comprei um terreno que não existe, construí uma casa que não existe, aluguei para alguém virtual e agora estou recebendo dinheiro que existe. E alguém agora quer comprar minha casa pelo dobro do preço.

Quando conto isso para alguém mais leigo ele pensa que é um hospício ou um circo. Parece loucura pagar US$ 4 mil por uma bolsa que não existe, ou US$ 69 milhões por um quadro em NFT. A gente tem visto coisas inacreditáveis. Mas tudo isso é um hype inicial. Quando alguém paga milhões por um quadro digital provavelmente não pensa só na peça, mas no hype e mídia que isso gera. A ponto de eu estar comentando isso agora.

É muito difícil prever se é um hype passageiro ou definitivo. Minha observação é que é algo importante, grande, e que merece proximidade das pessoas de TI. Estudar esse assunto, acompanhando com um pensamento que resumo em uma frase: não aguardar. E entender que nesse momento não é ROI [retorno sobre o investimento], é de ROL, com L de Learning. Aprender e coletar dados.

 

IT Forum: Já ouvimos no IT Forum especialistas que acreditam que iniciativas corporativas de metaverso precisam ser encaradas agora como projetos de inovação. Você concorda?

Longo: Sim. Mas [inovação] multidimensional. O que eu posso fazer no metaverso hoje e já trazer resultados? Montar uma loja em um shopping e vender produtos, que posso vender para um avatar incorpóreo ou para entregar na casa da pessoa. Posso fazer propaganda nas ruas de uma cidade no metaverso. Criar programas de gameficação com funcionários aumentando a produtividade deles. Vender óculos imersivos, vestes hápticas, joysticks etc.

É possível ter escolas no metaverso, com aulas imersivas. Ou montar uma agência de propaganda para fazer campanhas. Ou escritório de advocacia para lidar com eventuais problemas legais. Ou escritórios de arquitetura que ajudem as pessoas a montarem casas no metaverso. É infinito o que dá para fazer, e com uma vantagem: uma loja no [shopping] Iguatemi custa milhões, no Avakin Life custa milhares de reais no máximo.

Minha sugestão para todo mundo. Resumiria em uma frase: segura na mão de Deus e vai. E se der errado saia rápido. Digo o mesmo para o metaverso. Claro que algumas áreas são mais propícias. As áreas mais prováveis de início são varejo, serviços e educação.

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Marcelo Gimenes Vieira

Editor do IT Forum. Jornalista com 12 anos de experiência nos setores de TI, telecomunicações e saúde, sempre com um viés de negócios e inovação.

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