Quais são os próximos passos na estratégia de aquisições da CI&T

Presidente da companhia, Cesar Gon vê M&A como acelerador, mas não estratégia central de crescimento pós-IPO

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1:30 pm - 14 de fevereiro de 2022
Cesar Gon Cesar Gon, presidente e fundador da CI&T (Imagem: Divulgação/CI&T)

Em meados de janeiro, a CI&T anunciou a compra da Somo, empresa de produtos digitais com sede no Reino Unido. A aquisição foi a primeira da CI&T desde sua oferta pública inicial de ações, realizada em novembro do ano passado. Com o negócio, a companhia busca ampliar sua presença no mercado europeu, integrar talentos e atacar novas áreas de negócios.

O movimento não é inédito, mas marca um novo momento para a CI&T – de ida às compras. Com mais de duas décadas de história, a multinacional brasileira, fundada em Campinas (SP), sempre apostou em um sólido crescimento orgânico ao longo de sua história, mas vê as aquisições como um novo potencial braço de expansão.

Na preparação para o IPO, em junho passado, surpreendeu ao adquirir a Dextra, empresa de serviços de TI com mais de 1,2 mil funcionários divididos entre Brasil e Estados Unidos. Com Dextra e Somo no bolso, além de uma nova injeção de capital vinda de sua oferta de ações, a CI&T garante que tem apetite para continuar expandindo sua atuação global através de novas aquisições.

Em entrevista ao IT Forum, Cesar Gon, presidente e fundador da CI&T, falou sobre como – e em quais segmentos – esse estratégia poderá ser orientada no futuro. “M&A é um acelerador. Nossa estratégia é de crescimento agressivo orgânico. Quando a gente acha uma oportunidade, como achou com Dextra e Somo, de acelerar isso, a gente faz. Mas o coração do nosso crescimento não é consolidação de mercado. É um crescimento orgânico acelerado por aquisições bem escolhidas”, disse o executivo.

Confira os melhores momentos da entrevista abaixo:

O que essa aquisição representa para o momento em que a CI&T está agora?

“Nós temos executado uma visão que nasceu em 2019, quando a gente desenhou a abertura de capital. Tivemos a oportunidade de expandir bem além das fronteiras – já tínhamos uma grande operação em Estados Unidos e Brasil – e também de compor o crescimento orgânico, que é nossa história, com uma componente inorgânica de M&A. Isso aproveitando uma demanda secular – vamos ter décadas de demanda pelo digital – e de um mercado muito fragmentado. Em todos os países você tem a oportunidade de se consolidar um pouco.

Em particular, quando você fala de novas indústrias e novos mercados, o M&A pode ser uma peça importante de aceleração do crescimento. Para a CI&T, anunciamos logo no IPO que a Europa era uma prioridade. Tínhamos uma operação organicamente começando lá, mas já estávamos construindo esse pipeline [de M&A] há mais de doze meses.

Tínhamos alguns alvos, mas o principal era a Somo. É uma empresa inglesa; com receitas no Reino Unidos e nos Estados Unidos; com uma operação bem voltada para segmentos em que temos pouca exposição, mas que queremos avançar – que são automotivo e utilities –; e com clientes que têm o perfil típico de clientes da CI&T, globais. Todos os elementos ali. E também com alguma exposição internacional – a Soma tem 20% do time da Colômbia – que é um imperativo para jogar esse jogo de maneira mais global.

Também há uma combinação cultural. Conhecemos os fundadores e toda a liderança. A gente vêm há doze meses desenhando junto com eles esse acordo. Teria que ser feito pós-IPO, depois da digestão de Dextra – que terminamos a integração no mês passado. Então ele vem em uma sequência em que estamos executando o plano que verbalizamos para o mercado e para nossos acionistas.

Acho que uma característica de nossa estratégia de M&A são poucos acordos, mas acordos consistentes. Estamos falando aqui de um incremento de 12% na nossa receita em um único acordo, com um time de fundadores e líderes que estão dispostos a embarcar em uma criação de valor de longo prazo. É uma empresa de serviços, temos basicamente uma carteira de clientes e time, esses são os principais ativos que precisamos desenhar e preservar. Então estamos bem confortáveis e felizes que conseguimos fazer isso no início do ano. Em março já estarei lá, fazendo a apresentação de resultados com uma notícia dessas, que é um movimento muito sólido do ponto de vista de estratégia e crescimento.

Com essa aquisição, como a Europa se compara às outras regiões em que a CI&T está atuando?

O digital não reconhece nenhuma fronteira, é tendência no mundo todo. A grande diferença entre os países desenvolvidos e os países emergentes é a escassez de capital humano. O pessoal reclama muito no Brasil de que está faltando gente, mas você precisa ver nos Estados Unidos ou na Inglaterra. É um outro nível de escassez pela maturidade desses mercados. Essa equação de super demanda com escassez de talentos e tecnologia criou essa categoria dos especialistas em serviços de transformação digital, onde a CI&T é um player cada vez mais relevante.

Você não consegue jogar o jogo do digital sem conhecer especificamente país, cultura, regulação e vertical. A CI&T se posiciona com estratégia, design e engenharia, são os três grandes componentes da nossa proposta de valor. Tecnologia é a horizontal por design. Design já não é. Design já depende de vertical, de segmento de cultura. Um japonês interage com um ecommerce de forma diferente de um americano, de um inglês ou de um brasileiro. Quando você entra no design das jornadas, você tem uma componente cultural e local muito forte.

A estratégia é totalmente dependente do conhecimento da indústria local. Para construir Saúde nos Estados Unidos, você precisa conhecer a FDA [Administração de Medicamentos e Alimentos], tem que conhecer como funciona. É muito diferente do Brasil e de outros países. Para jogar a nossa proposta de valor, é preciso compor a tecnologia, que é horizontal e global, com presença e expertise em cada um dos países.

Então é esse jogo. A escala, que é a parte tecnológica, você faz de uma maneira independente da geografia. Mas a expansão para um país, você acelera muito quando consegue ter um time e um portfólio local.

Quais são as perspectivas da CI&T para 2022? Será um novo ano de expansão do mercado ou de desaceleração da digitalização?

A gente vai fazer um ano muito sólido. Em março estarei lá divulgando os resultados disso. E a gente está projetando um ano muito sólido, de resultados consistentes para os anos vindouros. Essa é uma indústria que vive muito crescimento de demanda, já é um mercado de mais de US$ 700 bilhões globalmente. Cresce 16% dependendo da região. Se você jogar bem, tem oportunidade de crescer bem mais que isso. Eu acho que é isso que continuaremos fazendo nos próximos anos.

Tecnologia e o digital são demandas seculares. A pandemia acelerou um processo de digitalização da sociedade, o que abriu horizontes maiores ainda para que novas possibilidades tecnológicas sejam implementadas. Olhar essa tendência como uma onda, algo passageiro, seria algo enviesado. A gente vai ter uma década de investimento constante no digital. A gente está só no início de um processo bastante exponencial de novidades tecnológicas e de mudanças de comportamento da sociedade.

A gente precisa olhar a transformação digital pelo prisma da tecnologia, obviamente, mas também pelo prisma da sociedade – dos valores da sociedade e comportamento de compra –, que acabam criando cada vez mais espaços para estratégias cada vez mais agressivas para o digital. Essa combinação de mega tendências está no início, o que a gente está vendo hoje de possibilidade tecnológica vai ser uma piada em cinco anos, em todas as suas dimensões. Obviamente que isso cria um tamanho de oportunidade que, insisto, é secular. Não é uma indústria que tem qualquer tipo de restrição de demanda. O que tem é uma complexidade do lado do fornecedor: orquestração de talentos e expertise para que seja consistente.

O que eu vejo é que, independente dessas volatilidades, dessas eventuais crises, é uma indústria de quem joga bem e se movimenta rápido. As oportunidades podem mudar, você pode pegar a pandemia como um exemplo. De repente a demanda mudou muito de forma, mas estava lá. A gente cresceu, fez um 20 – 21 muito forte, mesmo durante a pandemia. Mesmo agora, com essas intempéries econômicas, a gente vai fazer um 21 – 22 muito forte. A gente é uma empresa nativa digital, a gente tá desenhado para se mover rápido, para capturar as oportunidades. A gente está estimulando nossos clientes a terem modelos de estratégia e execução muito mais rápidos do que tinham. A gente precisa ser um exemplo disso.

Falando sobre as oportunidades que a CI&T enxerga e sobre o modelo de aquisição da empresa, baseado em combinação de culturas e aquisição de talentos: a gente pode esperar novas compras?

A Dextra, um pouco antes do IPO, e a Somo são exemplos do que a gente quer fazer. A gente tem capital e tem fôlego para fazer mais coisas legais ainda este ano. Por outro lado, também, a gente só vai fazer se tiver certeza que está fazendo bons acordos. Que são empresas que encaixam de verdade no ponto de vista de cultura e modelo de negócio. A gente quer e deve fazer, acho que temos muitas oportunidades.

Mas M&A é um acelerador, nossa estratégia é de crescimento agressivo orgânico. Quando a gente acha uma oportunidade, como achou com Dextra e Somo, de acelerar isso, aí a gente faz. Mas o coração do nosso crescimento não é consolidação de mercado. É um crescimento orgânico acelerado por aquisições bem escolhidas – e também de calibre, a gente não quer fazer dezenas pequenas aquisições. A gente faz aquisições relevantes que trazem volume, expertise, receita e carteira.

Como a estratégia de M&A está impactando a cultura da CI&T?

Uma empresa que cresce na velocidade e dinâmica que a gente cresce, e agora com a roupa do capital aberto, ela naturalmente vai se transformando. Não é novidade para a gente criar um novo jeito de operar. Empreender é mudar, a CI&T nunca foi uma empresa acomodada. Mas essa transformação precisa fazer sentido do ponto de vista de cultura e propósito. O processo de M&A é uma competência que a gente está conseguindo trazer para a empresa – temos um time, temos arquétipos de o que funciona, quais são os desafios. É uma competência de longo prazo.

A gente acha que isso tem muito espaço para consistentemente fazer aquisições ao longo da próxima década. Isso combina com uma empresa de capital aberto, que tem acesso a estruturas que estão disponíveis só para elas. Mas o ponto de partida é a cultura: a gente precisa preservar nossa cultura, que já é multi geografia, de diversidade e de experimentação. A gente tem o arcabouço para continuar consistente.

Por que a combinação de culturas é algo importante para a CI&T na estratégia de M&A?

A cultura emana diretamente da liderança, principalmente do CEO e fundadores. A gente está falando de uma empresa onde a cultura foi desenhada não pelo que as lideranças diziam, mas pelo que faziam, como encaravam problemas. Isso acaba sendo a principal fonte de combinação. E o digital é composição entre tecnologia e liderança. A liderança que consegue orquestrar as mudanças para que a tecnologia tenha impacto nas jornadas, no consumidor. É um assunto novo, empolgante. A gente está conseguindo executar isso de maneira consistente.

Ainda sobre o tema de aquisições: quais são as geografias e quais os segmentos de negócio que a CI&T deve mirar no futuro?

Nosso foco continua sendo Estados Unidos e Europa para o processo de M&A. É a tese, aumenta nossa receita em moeda forte, dólar e libras, e a gente tem muita competitividade usando nossa estrutura de nearshore – Brasil, Portugal e Colômbia. Obviamente que os mercados locais, como o Brasil, são importantes para a CI&T, mas o principal vetor de crescimento de longo prazo são as principais economias desenvolvidas onde a gente vai ganhando espaço ano após ano.

Do outro lado, a gente está trazendo uma expertise bem sólida de duas novas indústrias com a aquisição da Somo: automotiva e utilities. Há uma navegação em cima dessas, com a dimensão da CI&T, a gente pode levar essas competências para outros países em que a somo ainda não está atuando. Há um cross selling também, dentro dessas indústrias a gente pode contribuir com um expertise de casos de uso que já vimos ou estamos envolvidos também.

Como novas indústrias, a gente está priorizando as em que o impacto digital é mais óbvio: serviços financeiros, consumidores, varejo. A gente vai continuar priorizando indústrias onde claramente o digital é direto no impacto, como saúde, educação e lifestyle. E que tenham tamanho, a gente já tem escala, então algo de muito nicho não funciona para a gente por conta do nosso porte. Indústrias que tenham grande oportunidade no digital e que sejam representativas do ponto de vista global.

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