Mercado quer estimular ingresso de mulheres em TI

Hegemonia masculina, preconceito e exclusão afastam profissionais talentosas de carreira brilhante

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10:33 am - 07 de fevereiro de 2018

Quem atua no mercado de tecnologia sabe que as mulheres são minoria no setor. Para se ter uma ideia, em tecnologia da informação e comunicação (TIC), apenas 3% dos talentos formados no Brasil são do gênero feminino e dados da Harvard Business Review revelam que 41% das mulheres que atuam no segmento desistem da carreira. São muitos os motivos que as levam a interromper suas trilhas profissionais e a abandonarem graduações e especializações por acreditarem que será um esforço em vão. Preconceito, sexismo e exclusão são alguns.

Afinal, o que acontece? Por que elas se perdem no processo? Durante o evento Por um Planeta 50-50: mulheres e meninas na ciência e tecnologia, realizado pela Serasa Experian em parceria com a ONU Mulheres, Fábio Soares Eon, coordenador do setor de ciências naturais e ciências humanas e sociais da Unesco, elencou alguns motivos.

Para ele, um dos mais graves é o “efeito Matilda”, termo cunhado em 1993 pela pesquisadora da história da ciência Maraget Rossiter, que referenciou Matilda Gage, ativista e abolicionista norte-americana. O fenômeno aponta que descobertas e contribuições científicas feitas por mulheres são negligenciadas e atribuídas a pesquisadores homens, algo comum no mundo científico e acadêmico. “Os colegas se apropriavam do mérito ou a sociedade o concedia para os homens”, apontou Eon.

Mas o problema não para por aí. O executivo alerta que o desafio começa desde criança, muito em função dos pais e da sociedade. Basta ir a uma loja de brinquedos e verificar a seção de meninos com brinquedos radicais e, a das meninas, com bonecas e utensílios domésticos. “A sociedade, sem dúvidas, contribuiu para esses estereótipos e até a escola reproduz assimetrias”, observa, citando que recentemente sua filha não queria vestir uma camiseta azul, porque sua professora citou que era “cor de menino”.

O resultado? Dados da Unesco indicam que, em todo o mundo, apenas 28,4% da pesquisa científica é feita por mulheres. No Brasil, elas são 33,1% dos graduados em carreiras de ciências, tecnologias e matemática (STEM, na sigla em inglês) e 29,5% dos formados em engenharia. O Prêmio Nobel, maior reconhecimento da carreira de ciências, desde 1901 consagrou nada menos do que 97% de homens.

Luz no fim do túnel

Apesar do cenário negativo, há, sim, uma luz no fim do túnel. A boa notícia é que diversos grupos estão fazendo sua parte para incentivar o ingresso de mulheres na tecnologia e virar o jogo.

Esse é o caso da Serasa Experian. Em 2016, a empresa criou o programa Woman in Experian, que além de uma liderança mundial responsável pelo fomento do tema, possui representantes em cada uma das regiões nas quais atua. No Brasil, o tema é tão relevante que conta com duas forças femininas: a vice-presidente de Vendas e Marketing da Serasa Experian, Manzar Feres, representante do País e Cristiane Vargas, IT Leader da empresa.
O tema na companhia tem avançado. Globalmente, a Serasa conta com 52% de homens e 48% de mulheres. Na área de tecnologia da informação, contudo, há um longo caminho a ser percorrido. As programadoras compõem apenas 23% da equipe.

Para acelerar o ingresso de mulheres na empresa e na TI, a Serasa quer ampliar a parceria com empresas e comunidades para inspirar as meninas a ingressarem na tecnologia. Internamente, a companhia iniciará mentoring de mulheres para mulheres e estabeleceu um programa para não permitir que entrantes do sexo feminino negociem mal seus salários.

A Accenture também tem feito a sua parte. Renata Torres, managing director da empresa, relatou que a multinacional estabeleceu como meta ter 50% de mulheres em sua força de trabalho até 2025. Hoje, o número é de 40% na companhia, sendo que 25% delas ocupam o cargo de managing directors.

“O desafio é que apenas 15% das matrículas nos cursos de tecnologia são feitas por mulheres. E no primeiro ano da faculdade, oito em cada dez delas desistem, segundo números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)”, lembrou.

Renata, que está há 20 anos em TI, foi promovida há pouco mais de dois anos e sentiu na pele o que os dados indicavam. Ela era a única mulher do time. Para não deixar seu esforço passar em branco, incentivou o desenvolvimento de iniciativas para fomentar o ingresso de mulheres na empresa. Em setembro de 2017 surgiu, então, o Accenture New Women, que tem o objetivo de estimular o desenvolvimento de mulheres em tecnologia com base em quatro pilares: atração de talentos, mentoria, retenção e estabelecimento de redes de relacionamento de grupo de mulheres.

A CA também tem engajado funcionários e a comunidade em torno do tema. Alexandre Scaglia, diretor de Comunicações para a América Latina, comentou que o compromisso é global. No ano passado, a empresa criou diversas iniciativas no Brasil para endereçar a questão, como o Tech Innovation Challenge, que reuniu mais de mil meninas de dez a 16 anos para desenvolver aplicativos e resolver problemas sociais. “Plantamos uma semente”, disse.

Há ainda o programa Gerando Falcões, em Poá, em São Paulo, para ensinar lógica básica de programação para jovens meninas. “Formamos 30 meninas e uma delas, inclusive, passou em uma vaga de estágio na Accenture”, comemorou. A companhia também trabalha com a ONG Programaria, que ensina programação a mulheres, que na última edição do curso recebeu mais de mil inscrições para 25 vagas.

A gigante Microsoft, comandada no Brasil por uma mulher, a Paula Bellizia, também engrossa o coro do ingresso das mulheres na TI. Gustavo Gattass, gerente de Produtos e líder da Comunidade Diversidade Mulheres da Microsoft, listou uma série de iniciativas da empresa. Uma delas é a DigiGirls, workshop de um dia voltado para meninas adolescentes entre 11 e 15 anos com o propósito de despertar o interesse pela área. “Começamos com filhas de colaboradores. Estamos agora estendendo a ação a parceiros e levando para escolas.”

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