Low-code precisa de sinergia entre negócio e TI, defende CTO da Magic Software

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11:00 am - 26 de janeiro de 2022
Java liguagem de programação

Plataformas que simplificam o desenvolvimento, apelidadas de low-code – ou no-code, em alguns casos –, são uma das principais discussões atuais do setor de TI. Segundo previsões do Gartner, até 2024, 80% dos produtos e serviços de tecnologia do mundo serão criados por profissionais que não são profissionais de tecnologia.

Mas apesar do hype atual, plataformas de low-code não são necessariamente uma novidade. Fundada em 1983, a companhia israelense Magic Software Enterprises é exemplo disso, tendo trabalhado em uma ferramenta de low-code para aplicações comerciais há décadas.

Diretor de tecnologia da companhia, Yuval Lavi conta que ainda guarda um documento da companhia, datado de 1987, que explica a solução “Magic PC Data”. “Esse é um dos nossos primeiros documentos que explicam os benefícios do Magic para aplicações de base de dados. Na época nem chamávamos aplicativos de negócios”, brinca.

Mas isso não significa que a adoção de ferramentas low-code pode ser feita de qualquer jeito. Em entrevista ao IT Forum, Lavi falou sobre a importância de se criar provas de conceito, escolher bem quais são as ferramentas de low-code que se encaixam com sua demanda e – principalmente – garantir que há “sinergia” entre as soluções adotadas e os departamentos de TI.

“Se você trouxer uma ferramenta de low-code da qual a equipe de negócio gosta, mas com a qual a TI não se sente confortável, ela vai rejeitá-la”, alerta. Confira abaixo:

Soluções de low-code já existem há muitas décadas, mas agora estamos vendo o que parece ser um ressurgimento da tendência. Por que isso?

“Eu acredito que há um enorme retorno ao low-code hoje em dia. Além do fato de que a história sempre se repete, um dos gatilhos disso é a força de trabalho milenial e da geração Z, que esperam interagir com o local de trabalho de uma forma completamente diferente do que eu interagia quando comecei a trabalhar.

Do ponto de vista do cliente, muito disso também é por conta da força de trabalho. Há uma grande demanda por soluções digitais que programação tradicional não é capaz de resolver. Ela não é capaz de acompanhar. Estamos falando do fato de que, nos próximos 10 anos, haverá uma demanda por cinco milhões de novas aplicações digitais. Isso é mais do que o número de aplicações desenvolvidas até hoje. Isso significa que a demanda é enorme. A mão de obra simplesmente não é suficiente.

Além disso, as tecnologias estão se tornando cada vez mais complexas. Eu comparo isso a dirigir um carro: nem todo mundo que dirige um carro precisa saber como o motor funciona. Eu só preciso entrar no carro, dar a ignição e dirigir. Há 100 anos, você precisava entender de mecânica para dirigir um carro. Porque depois de andar algumas centenas de metros, o carro ia parar, você ia precisar colocar óleo, colocar água. Mas os carros se tornaram mais e mais fáceis de se usar.

[A tecnologia] está indo na mesma direção. Nós sempre precisaremos de desenvolvedores. Desenvolvedores sempre serão importantes. Mas, eventualmente, se você só precisa de um carro para ir do ponto A ao ponto B, você não precisa ser um mecânico. Você só precisa investir em um bom carro. É isso que nós propomos [com o low-code]: entregar valor de negócio, não valor de tecnologia.”

O Gartner tem uma previsão de que, até 2024, 80% dos produtos e serviços de tecnologia serão criados por pessoas que não são profissionais de tecnologia. Você acha que estamos a caminho disso?

“Low-code está definitivamente acontecendo. Você vê mais e mais startups construindo suas soluções em low-code. Você vê mais e mais grandes empresas adotando low-code. É uma necessidade. E eu culpo os smartphones. Esses dispositivos, quando você compra um modelo novo, depois de seis meses, já pode ser considerado antigo. A velocidade com que as coisas estão mudando e como esperamos que as experiências mudem, é impressionante. Não é como há 20 anos: quando desenvolvemos uma aplicação, ela ficava rodando pelos próximos dez, 15 ou 20 anos. Hoje não é assim.

As empresas entenderam: o que quer que elas desenvolvam só será relevante para o próximo ano, não muito além disso. Elas não podem construir algo na forma tradicional, levando um ano inteiro, com um grande investimento em força de trabalho, para depois jogar fora. É aí que é necessária a agilidade do low-code.

Mas tenho dito: a plataforma [de low-code] precisa ser adotada pelo negócio, mas validada pela TI. Como o Gartner apontou, a maior parte das aplicações será desenvolvida por pessoas que não são da TI. Mas você não pode deixar pessoas de TI de lado. As pessoas de TI ainda são os responsáveis por segurança, disponibilidade, evitar danos à organização. Se você trouxer uma ferramenta de low-code da qual o negócio gosta, mas que a TI não se sente confortável, ela vai rejeitá-la. Essa é a sinergia que deve existir com plataformas de low-code. Deve haver sinergia entre governança, segurança, controle central, acesso aos dados – tudo que temos na programação tradicional. Mas, por outro lado, dar opções às pessoas de negócio, de construírem aplicações de forma rápida. É preciso haver um equilíbrio.

Você considera essa sinergia entre TI e negócios o maior desafio atual do low-code?

De certa forma, sim. Esse é o maior desafio para a adoção ampla do low-code. Há outros desafios quando falamos sobre low-code de hoje, quando comparado às ferramentas de desenvolvimento rápido do passado. Hoje, as ferramentas precisam ser abertas. E quando digo abertas, estou falando sobre esse equilíbrio: ser customizável e transparente. Mesmo nós, como Magic, no passado éramos uma caixa preta. Uma caixa preta que fazia mágica. Mas pessoas de TI não se sentiam confortáveis com isso, porque não se sabia o que estava acontecendo por trás. Eles queriam a transparência. Hoje em dia nós temos transparência, você pode mexer e configurar a qualquer momento. Isso é muito importante para uma ferramenta de low-code que chega ao mercado.

Você pode fazer uma indicação de para quais empresas o low-code é e para quais ele não é?

Eu sou um pouco enviesado, acredito que o low-code é para todos. Mas é preciso entender que há uma graduação. Por exemplo: você pode ir a pé a qualquer lugar, você pode escalar uma montanha, pode nadar. Nada vai te impedir. Mas vai ser mais demorado para chegar ao seu destino. Então você pode usar, por exemplo, uma bicicleta. Com uma bicicleta você pode ir mais rápido, mas já não pode entrar dentro d’água. Então deve haver um caso de uso claro.

Então, quando você aposta no low-code, você faz concessões. Não pegue low-code se você quer desenvolver, por exemplo, um jogo para smartphones. Use uma plataforma diferente. Aliás, há diferentes plataformas de low-code que endereçam problemas diferentes. Há plataformas de low-code para IoT, há plataformas de low-code para desenvolvimento de aplicações de negócio, há plataformas de low-code para Power BI, coisas assim. Quando você pega uma plataforma de low-code, já está decidindo que vai usar para um caso de uso específico. Há limitações, então você precisa garantir que está usando o low-code que se encaixa na sua necessidade.

Ainda sobre o tema: sistemas legados são uma limitação para low-code?

Hoje em dia, não. Hoje em dia, ao contrário do passado – quando [ferramentas de low-code] eram uma caixa preta –, é claro quais são os legados das empresas. Nós entendemos que sistemas legados vão continuar existindo. Nossa ideia não é substituir, mas unir forçar. Expor funcionalidades. Não pegue sua aplicação de mainframe e tente rodá-la em sistemas móveis, mas traga uma solução que pode expor funcionalidades para mobile de forma funcional e segura. É aí que a conectividade, integração e APIs entram. Quando a gente olha para tecnologias corporativas hoje em dia, elas não são substituições, são melhorias. Há dez anos, tínhamos muita competição entre todos os vendedores para um substituir o outro. Hoje, não vemos substituição. Todos os novos projetos e clientes não estão substituindo, estão adicionando funcionalidades. O mundo está se tornando mais complexo, a demanda é muito maior, e por isso precisamos de melhores funcionalidades. Você precisa aprender a coexistir.

Como empresas podem começar a experimentar com o low-code?

É difícil dar uma resposta. Nós usamos low-code como um statement. Mas é quase como perguntar: “Você fala língua?” Qual lingua? Em qual país? É um mundo enorme, se você fala sobre low-code, são milhares de soluções. E, como qualquer assunto popular no mercado, todo mundo tem dito que é low-code. São duas boas palavras para adicionar ao seu site e brilhar. Mas o mais básico, mesmo antes de você experimentar a ferramenta, você precisa validar internamente os casos de uso que está buscando resolver.

É um nível de maturidade que a organização precisa ter para se questionar: “estou disposto e sou capaz de tirar um pouco de poder do meu departamento de TI?” Se você tem um departamento de TI que concentra tudo, ele não vai permitir que você traga nada. É primeiro uma missão interna. Depois, fazer provas de conceito. E lembre-se: cada empresa que provê ferramentas de low-code, faz isso a partir de um ângulo diferente. Você precisa saber se ela está cobrindo tudo que deseja.

Isso é um ponto interessante: desenvolvedores e programadores ainda são muito resistentes ao low-code?

Sim e não. Menos do que no passado. Há dez ou 15 anos, os desenvolvedores eram mais resistentes ao low-code porque queriam ser codificadores. Se você não estivesse trabalhando duro, significa que não está fazendo um trabalho bom o suficiente. Que não está avançando. Mas hoje em dia, penso que organizações e desenvolvedores entendem mais e mais que precisam pensar sobre o negócio. Há muitos anos, o departamento de TI era “sagrado”, tinham todo o conhecimento. Hoje as pessoas entenderam que negócios geram negócios, não tecnologia.

O hype é algo negativo para o low-code em alguma medida?

Eu não acredito que traga algo negativo. De novo, sou um pouco enviesado, durante muitos anos fui considerado com algo a se deixar de lado. Quando eu dizia que era um desenvolvedor há muitos anos, as pessoas perguntavam em que linguagem eu desenvolvia, eu dizia “Magic” e elas retrucavam que Magic não era um linguagem de programação. Caracterizavam o low-code como algo não sério. Hoje ninguém mais desconsidera o low-code. Nesse aspecto é positivo.

Também acho que os clientes e usuários são espertos o suficiente para não prestarem atenção em qualquer um que se diz low-code. Se você olha uma solução que custa US$ 5 por mês/usuário e outra que custa US$ 500 por mês/usuário, não vai achar que as duas são a mesma coisa. Não significa que a de US$ 5 é ruim: pense no caso de uso. Se é bom o suficiente para seu caso de uso, adote. Você não está comparando coisas iguais, mesmo que ambas sejam low-code.

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