Gigantes de tecnologia estão em crise de legitimidade, diz Paul Hilder

Empreendedor social britânico acredita que é preciso identificar o que há de valioso em organizações atuais para transformá-las em algo melhor

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9:00 am - 29 de março de 2021
LGPD impactos destaque Adobe Stock

O futuro das sociedades e de suas instituições será definido pelas discussões sobre os impactos da tecnologia que teremos nesta década. Essa foi a avaliação do escritor britânico Paul Hilder durante uma participação no debate virtual “Novo Poder: Fake News, Redes Sociais e Micropoderes”, promovido pela GoNew na última sexta-feira (26).

Ativista, empreendedor social e fundador de plataformas como a Datapraxis e openDemocracy, Hilder ganhou notoriedade através de sua participação no documentário Privacidade Hackeada, da Netflix, e por seu trabalho junto à Brittany Kaiser, ex-diretora da Cambridge Analytica que expôs detalhes do escândalo envolvendo a empresa de análise de dados e o Facebook.

Para o especialista, vivemos em um momento de “crise de legitimidade” das grandes empresas de tecnologia e a discussão sobre como lidar com os problemas gerados por elas é iminente. “Nós vimos uma série de eventos que trouxeram ameaças vívidas à democracia, à sociedade civil e ao funcionamento de mercados”, apontou. “Representados por essas máquinas fora de controle, que são intermediárias da maioria de nossas interações sociais.”

O comentário de Hilder veio na semana em que Jack Dorsey, CEO do Twitter, Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, e Sundar Pichai, CEO do Google, foram questionados pelo Congresso dos Estados Unidos sobre o papel das três empresas no espalhamento de informações falsas e no potencial impacto que tiveram na insurreição e invasão do Capitólio, em Washington DC, em janeiro deste ano.

Segundo ele, a força dessas companhias criou uma organização de poder que pode ser entendida como uma espécie de “teia de aranha”, na qual indivíduos e organizações estão ligados em rede e influenciam uns aos outros. Ele vê a organização como empoderadora, mas também como um grande desafio para a autonomia e identidade de indivíduos – já que somos constantemente influenciados por outras pessoas, governos ou empresas que “puxam” os fios da teia através de nossas conexões.

“Construímos as coisas de certa forma e podemos construí-las de uma forma melhor. Mas isso vai exigir uma grande discussão, muitos argumentos e muito poder até chegarmos em um lugar melhor”, pontuou.

Também presente no debate, Salim Ismail, fundador da Singularity University (SU), ecoou a avaliação de Hilder, mas reforçou o impacto das mudanças do ponto de vista de empresas e governos. Para ele, essas organizações têm sofrido para absorver o progresso trazido pelo ritmo acelerado de transformação tecnológica, que está “quebrando” as fundações a partir das quais dirigimos o mundo.

O empreendedor avalia que o problema por trás da questão é a “resposta imune” de organizações às mudanças, que as leva a apostarem na previsibilidade ao invés de abraçar inovações. “Se não resolvermos esse problema do ‘sistema imunológico’ e da nossa resistência às novas ideias, não importa o que as tecnologias fazem, nós não as estaremos implementando. Nós temos que resolver isso antes para melhor absorver novas ideias”, opinou.

Alerta ao “culto de disrupção”

Apesar de concordar com a necessidade de “mudanças exponenciais” para enfrentar os desafios trazidos pela evolução tecnológica, Paul Hilder fez também um alerta contra os exageros do “culto de disrupção” promovido por empresas do Vale do Silício.

Para o britânico, é importante que transformações sejam orientadas por valores como “eficiência e inteligência social e emocional”, buscando entender o que já existe de valioso em estruturas e organizações atuais para transformá-las em algo melhor – não apenas para propor uma simples “disrupção”.

“A questão é como encontrar a parte da ‘resposta imune’ que pode se tornar produtiva”, avaliou. “Quais são os elementos na cultura, nas instituições, nas relações sociais, na rede informal de poder de instituições, que são preciosas; que precisamos construir e dar uma nova forma em uma nova estrutura”, defendeu.

“Uma dos resultados da pandemia foi as pessoas entenderem a necessidade de governos”, acrescentou Ismail, concordando com o ponto de Hilder. “Nós estamos em uma era cada vez mais volátil, nós precisamos da ‘gordura’ e da absorção de choque que o governo provê ainda mais.”

O empreendedor, no entanto, reforça acreditar que o papel pode ser otimizado através de tecnologias. Blockchains, exemplifica ele, podem ser uma alternativa para autenticação de documentos, reduzindo o custo e aumentando a eficiência do trabalho de verificação desempenhando por agências governamentais. “A oportunidade de alavancar novas ideias é profunda e nós deveríamos tirar proveito disso”, concluiu o fundador da SU.

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