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Ano novo, velhas práticas?

Na primeira semana do ano, nosso escritório de advocacia, SV Law, foi procurado por dois sócios de uma empresa bem-sucedida no setor de prestação de serviços. A empresa é composta por oito sócios no total, sendo que havia um acordo tácito de que todos os sócios devem trabalhar no negócio – o acordo sempre foi tácito, ninguém “precisou falar isto”, em tempo algum, me disse um dos sócios.

Ocorre que, no último trimestre de 2015, dois outros sócios da empresa, que são fundadores do negócio, acabaram desenvolvendo um negócio paralelo e muito promissor – e que, claro, não concorre com a empresa de prestação de serviços. Esta nova empresa começou a ganhar corpo e, consequência natural, a demandar mais e mais horas de trabalho destes sócios fundadores.

A ausência cada vez maior deles na empresa foi gerando desconforto e, na medida em que eles iam se afastando da empresa prestadora de serviços, o desconforto foi aumentando. O faturamento destes sócios caiu, prejudicando toda a empresa. A participação destes sócios em reuniões, prospecção de clientes e nas decisões administrativas também caiu bastante e, depois de um ano, o clima ficou insustentável.

Em janeiro de 2017, todos os sócios participaram de uma reunião em que o assunto foi abordado e, eureca, a solução foi proposta e aceita por todos: os dois sócios fundadores deveriam vender suas participações para os outros sócios.

Em dezembro de 2017, a negociação não estava nem perto do fim. Motivo? Não houve consenso quanto ao método de avaliação da participação destes sócios. Dentre os temas abordados nesta extensa – demasiadamente extensa, em nossa opinião – negociação, os métodos de avaliação da empresa foram os mais debatidos. Os métodos mais comuns utilizados em negociações, como múltiplos de EBITDA, fluxo de caixa descontado, foram somados a assuntos que iam e voltavam para a mesa de negociação, como prêmio de controle e fundo de comércio. Não que estes temas devam ser somados a uma mesma negociação, mas, no fundo, foi um caso clássico em quem os vendedores têm um número na cabeça, advindo de suas convicções pessoais, e vai tentar utilizar um método de avaliação de sua participação acionária que apenas valide o seu “número idealizado”.

Após um ano, portanto, de negociações, dois dos sócios perderam a confiança nos vendedores, tanto pela falta de definição do assunto quanto pela mudança constante nos critérios de avaliação – que, por acaso, só favoreciam os vendedores – e quanto pelo fato dos vendedores terem passado o ano inteiro recebendo dividendos de uma forma injusta, na opinião destes sócios compradores.

A decisão dos compradores foi a de sair do negócio – “dado que eles não saem, saio eu”. Quem perde com isto? Os vendedores, que irão perder cerca de 30% (trinta por cento) do seu faturamento da noite para o dia, sofrendo, ao menos, três potenciais prejuízos diretos: (a) o não recebimento do preço da venda das suas ações na alta, com a empresa estável e sócios com vontade de trabalhar, (b) por perder um faturamento expressivo na empresa e (c) por um possível dano de imagem, tanto internamente, quanto para com clientes, em decorrência da saída destes dois sócios – outros podem tomar a mesma decisão.

Além disto, a saída destes sócios iria demandar muito trabalho para a estabilização da empresa. Neste sentido, ou os sócios fundadores deixam o novo negócio de lado (espero que eles não tenham outros sócios nesta nova empresa, sob pena de viverem o mesmo cenário), ou vão deixar o negócio principal à deriva, com a possível saída de novos sócios e, também, com o ataque dos concorrentes aos seus clientes e outros profissionais, sócios ou não, que trabalham na empresa.

Mas não só os vendedores saem prejudicados: a empresa perde valor, os sócios remanescentes também terão uma situação difícil para lidar (ficar ou não na sociedade, acalmar clientes e equipe interna) e os sócios retirantes também terão que enfrentar novos desafios, seja por conta da abertura de uma nova empresa, com todas as dificuldades atreladas a isto, seja pela dificuldade natural em conseguir novos sócios – e estar alinhados com eles.

Entra ano, sai ano, muita coisa boa acontece, mas, também, situações como esta se repetem anualmente. Confesso que, apesar de prestar serviço neste tipo de situação e cobrar por isto, gostaria que, em 2018, todos, e não menos que todos, os empreendedores/pessoas de negócio fizessem um acordo de sócios. Para aqueles que acham que não precisam, para aqueles que confiam plenamente nos sócios – neste caso, os oito sócios estão juntos há mais de 10 anos -, para aqueles que não suportam lidar com advogado, eis meu apelo: faça um acordo de sócios mais simples, mas faça. Preveja, no mínimo, como um sócio entra na sociedade e como ele sai. Preveja o método de avaliação da empresa, mesmo que vocês alterem este método ao longo do curso dos negócios. Preveja o método de pagamento na saída de um sócio – nem toda empresa está pronta para pagar aquela participação à vista, melhor seria dividir o preço em parcelas mensais, por um período de 2 a 5 anos, preservando o caixa da empresa. Preveja a hipótese de um sócio divorciar-se – você não gostaria de ganhar a ex-mulher do seu sócio como sua sócia neste ano, gostaria?

Claro que as hipóteses a serem previstas em um acordo de sócios são muito mais extensas do que as listadas acima, os exemplos acima são apenas…exemplos. Ao decidir abrir uma empresa ou tornar-se sócio de uma empresa, você também chama para si a responsabilidade de todos os riscos do negócio. A perda de um sócio ou um conflito com um sócio é algo que você deve prever antes de entrar em uma sociedade. Faz sentido você fazer um seguro do seu carro e não ter um seguro da sua sociedade?

 

(*)  Rodrigo Valverde é sócio do escritório de advocacia SV Law

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