42, a ‘escola’ gratuita, sem professor, que ensina programação no Brasil

Com formato disruptivo, estudantes expressem criatividade graças à aprendizagem baseada em projetos

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5:17 pm - 18 de setembro de 2019

O método tradicional de aprendizado no qual o professor ensina e o aluno ouve estão com os dias contados? Se depender da 42, sim. A ‘escola’, fundada na França em 2013, chega ao Brasil com sua primeira unidade na América Latina, em São Paulo, com o apoio da Fundação Telefônica Vivo. A proposta é promover uma educação baseada na aprendizagem entre pares: participativa, sem aulas, sem custo para o aluno e sem professores, permitindo que os estudantes expressem sua criatividade graças à aprendizagem baseada em projetos.

Christian Gebara, presidente da Telefônica Vivo, indiciou que o propósito da empresa está em linha com a 42 e por isso o apoio nos próximos três anos de vida da 42 em solo nacional. “Queremos conectar todo o País. E conexão está relacionada à inclusão e educação.”

A 42 não gosta de ser rotulada como uma escola, mas também um centro de treinamento não definiria com plenitude a metodologia que propõe. “Não tem certo ou errado. Somos diferentes. Entendemos que iniciamos uma grande transformação do mercado acadêmico”, revelou em coletiva de imprensa Karen Kanaan, diretora e uma das sócias da 42.

Localizada na Vila Madalena, bairro cool da capital paulista, a 42 ocupa dois andares em um espaço que mescla criatividade, arte e inovação. Com uma escassez projetada de mais de 250 mil talentos em tecnologia no Brasil, estimular a formação de profissionais na área torna-se crítico e a 42 entendeu isso. Portanto, o objetivo ali é fomentar a capacitação de desenvolvedores, que podem ou não ter conhecimento tecnológico prévio.

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Guilherme Decourt, diretor da 42 São Paulo, contou à imprensa que são seis os pilares que sustentam o modelo do local: game, projetos reais, colaboração, aprendizado em pares, horários flexíveis, já que o espaço fica aberto 24h, e gratuito.

A seleção de estudantes no Brasil começou em junho pelo site e registrou o interesse de 12 mil pessoas, sem qualquer tipo de publicidade. Só foram feitas postagens em redes sociais. Em apenas 25 dias, a 42 em São Paulo teve o mesmo número que a França estimou que seriam necessários em ao menos três meses.

Após o registro no site, uma primeira seleção foi feita on-line por meio de um teste de aptidão em formato de game. Nessa etapa, 2 mil pessoas foram aprovadas. Para participar, era preciso ter mais de 18 anos. E o mais interessante: não é necessária formação no Ensino Médio ou Superior.

No check-in, a fase em que conhecem todo o funcionamento da 42 presencialmente, participaram 800 pessoas. Depois, os alunos selecionados integram a “piscina” por um mês para concluir os projetos de software, um teste de quatro semanas para selecionar os perfis mais adequados e familiarizar os candidatos com princípios da 42: ritmo sustentado, trabalho em equipe e aprendizado autônomo. Nessa etapa, foram 352 inscritos, sendo 30% deles mulheres.

Os que mais se desenvolverem durante o período foram admitidos na 42. Após iniciado, o curso pode ser concluído em até cinco anos, de acordo com o ritmo de cada um. Em duas semanas, a 42 receberá seus primeiros 176 alunos.

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Apesar de gratuita, a 42 entendeu que estudantes podem ter dificuldade de deslocamento para a 42, a escola oferece bolsas de transporte, alimentação e moradia: 30% dos selecionados solicitaram esse benefício.

Decourt indiciou que o aluno evolui com o tempo e recebe uma série de desafios para resolver. “É preciso manipular pixels para reconstruir o jogo Wolf 3D, famoso na década de 90. Outra missão é recriar o YouTube, tanto no front, quanto no backend”, exemplificou.

Aprender a se virar

Karen assinalou que o formato da 42 incentiva as pessoas a aprender e errar, mas, especialmente ‘se virar’. “Elas vão reaprender a aprender”, contou ela. Como não há professores, e o aprendizado é por duplas e coletivo, há um material de referência básico, mas a ‘Enciclopédia Google’ e o YouTube se tornam os melhores amigos dos estudantes.

Após a entrada na 42, o participante não espera que o conhecimento venha até ele, mas precisa estar preparado para buscar por si, se juntar a outros para explorar soluções originais e compartilhar seu trabalho. Os alunos têm exercícios, projetos reais e são avaliados pelos próprios colegas. Para progredir, eles precisam contar com a força do grupo, dar e receber informações, trocando de papéis constantemente para ajudarem os outros e serem ajudados.

O perfil ideal do aluno da 42, segundo Karen, é aquele que mostra comprometimento, gosta de resolver problemas, trabalha bem em equipe e tem autonomia. Características que pessoas de qualquer idade podem reunir, garantiu.

Fernanda Moura participou da 42 no Vale do Silício, nos Estados Unidos. Parou na fase da piscina, mas lembrou da experiência de participar do projeto. Advogada, sempre gostou de tecnologia e queria transformar sua carreira. Via na 42 uma oportunidade. “Apesar de não ter me tornado aluna, o aprendizado do processo foi muito rico”, revelou.

Guiga Caixeta, ex-aluno da 42 no Vale do Silício, participa atualmente da implementação da escola em São Paulo. Ele cursava o terceiro ano de Engenharia e Automação na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) quando conheceu a escola e decidiu trancar a faculdade. “Na piscina, a cultura entre pares emerge e aprendemos a aprender. Me senti muito empoderado com esse modelo”, contou.

Como surgiu a 42?

A 42 foi criada pelos franceses Xavier Niel, fundador do maior campus de startups do mundo, a Station F, e por Nicolas Sadirac, fundador e ex-diretor-executivo da rede de escolas particulares de código Epitec, quando a indústria da tecnologia da informação foi atingida por uma grande escassez de desenvolvedores. Niel foi autodidata em tecnologia. Aprendeu sozinho a programar e queria replicar o modelo para outras pessoas, que assim como ele queriam estar prontas para profissões do futuro.

Para treinar em massa os melhores talentos de hoje e do amanhã, independentemente da sua formação, a 42 está hoje disseminando seu modelo internacionalmente e sua rede conta campi parceiros de diversos países: França, Bélgica, Marrocos, Finlândia, Holanda, Rússia, Brasil, Indonésia, Armênia, Japão, Colômbia, Espanha e Canadá. Já são 20 campi em cinco continentes. No Brasil, o Rio de Janeiro é o próximo destino da 42 e na América Latina a Colômbia também receberá o modelo educacional em 2020.

Em Paris, onde surgiu, a 42 já soma 4 mil alunos ativos. Uma delas ressignificou completamente sua carreira, ao participar do programa deixou a profissão de vendedora de pet shop e tornou-se, em apenas três anos, diretora de tecnologia de uma empresa no país.

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