Profissões antigas ganham nova relevância na era digital

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2:59 pm - 15 de janeiro de 2020

Formada em sociologia e antropologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Carol Zatorre encontrou oportunidade para aplicar conceitos e teorias da antropologia em projetos de inovação de empresas. Ainda durante a graduação, ela se envolveu em um trabalho do núcleo de design e sustentabilidade da universidade, a convite de um amigo.

 

 

Não parou mais. Até 2014, Carol desenvolveu projetos para grandes empresas e consultorias, como McKinsey. Dessa experiência nasceu, há cinco anos, a Kyvo Design-Driven Innovation, consultoria de inovação que atende clientes como Visa, Ticket, Banco do Brasil (BB) e Itaú Unibanco.

 

 

“Sempre achei que antropologia tinha que falar com o mundo”, observa Carol. Segundo ela, a formação do antropólogo brasileiro ainda é muito voltada para a produção de conhecimento acadêmico. Com a demanda crescente de empresas por profissionais que consigam dialogar com a área de inovação ou possam se envolver diretamente com os projetos, esse quadro tem começado a mudar.

 

 

“Fora do Brasil, existem cadeiras de ‘business’ nos mestrados de antropologia. O Facebook tem um time de antropólogos”, exemplifica. No Brasil, empresas buscam antropólogos para atuar não apenas com inovação, mas também em experiência do usuário (UX, na sigla em inglês). Carol diz que o interesse começa a ganhar força em companhias do setor financeiro, de saúde e educação, além de startups.

“Fora do Brasil, existem cadeiras de ‘business’ nos mestrados de antropologia. O Facebook tem um time de antropólogos”

Para quem deseja seguir esse caminho, a indicação é ampliar o olhar com leituras e estudos que vão muito além de conceitos teóricos da antropologia. É preciso entender de negócios e gestão, por exemplo, para conseguir aplicar a teoria antropológica conforme as demandas corporativas. “A linguagem é diferente. A forma de apresentar o conteúdo precisa ter fit com o que o cliente está contratando. Tudo isso aprende com experiência, não tem jeito”, diz Carol.

 

 

Profissões com nova roupagem

 

 

A antropologia é um ótimo exemplo de profissões antigas ou tradicionais que voltaram à “moda” ou se reinventaram para um mundo em constante transformação social, econômica e tecnológica. Na visão dos especialistas, algumas carreiras e ocupações deixam de ter uma só função e passam a ser relevantes em diversas áreas.

 

 

A atuação de advogados, engenheiros, médicos, professores e administradores, por exemplo, não se restringe mais a apenas um tipo de trabalho. Um professor só ensinava, mas agora pode estar em outros ambientes. Já um fisioterapeuta pode gerenciar uma clínica”, exemplifica Anna Cherubina, professora dos MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV).

 

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“Nada fica démodé. O que acontece é que, com a modernização do mercado de trabalho, a tecnologia pode substituir algumas profissões ou a evolução desse profissional vai permitir que a experiência volte a ser relevante, desde que a pessoa se atualize”, aponta Rodrigo Vianna, CEO da Mappit, empresa do Talenses Group especializada em vagas de início de carreira. Bibliotecários têm sido recrutados para trabalhar com tratamento e organização de dados.

 

“Com a modernização do mercado de trabalho, a tecnologia pode substituir algumas profissões ou a evolução desse profissional vai permitir que a experiência volte a ser relevante, desde que a pessoa se atualize”

Anna reforça a importância de os profissionais perceberem cada vez mais a multiplicidade de função, ou seja, que determinado conhecimento pode ser utilizado para diversas finalidades e em diferentes áreas. Isso significa não ficar restrito a uma formação e começar o quanto antes a buscar novas tecnologias, metodologias e entender de tendências de mercado. Segundo a professora, uma das competências fundamentais atualmente é a orientação para o aprendizado, mantendo abertura para o novo.

 

 

Segundo Vianna, existe uma janela de oportunidades em customer experience (experiência do consumidor, em português). Vagas nessa área podem ser ocupadas por profissionais com diferentes formações, exemplifica. Vai depender, claro, das atribuições e responsabilidades da função e do segmento no qual a empresa atua.

 

 

Mudanças no perfil do consumidor

 

 

A evolução das profissões tem a ver com o avanço da tecnologia e do mercado de trabalho, mas não só isso. As mudanças de hábitos e demandas do consumidor ditam alguns movimentos interessantes. Ocupações tradicionais como barbeiro, cuidador de idosos, açougueiro, alfaiate e costureiro começaram a ser resgatadas nos últimos anos. Não é que tenham desaparecido. Muito pelo contrário. Ganharam nova importância diante de um novo perfil de consumidor.

 

 

“O ser humano volta para a própria essência. Daí serviços manuais especializados, como bordado e alfaiataria, não deixarem de ser demandados. São talentos que a tecnologia não pode engolir”, avalia Anna, da FGV. Segundo ela, a preocupação com sustentabilidade também contribui para o aproveitamento de capacidades puramente humanas, como a criatividade.

 

 

Ao mesmo tempo, outras profissões passam a ser valorizadas com uso cada vez mais de tecnologia. É o caso de arquitetos, que trocaram as antigas pranchetas por softwares específicos. Outro exemplo é a demanda por físicos e matemáticos para atuar na área de análise de investimentos ou inteligência artificial (IA). “Muitas graduações estão sendo repensadas, porque da forma que foram desenvolvidas não fazem mais sentido”, afirma a professora.

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