Machine learning abre oportunidades para novos empregos e negócios

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7:51 pm - 10 de outubro de 2019

É antiga a ideia de que os robôs podem substituir os seres humanos ou, ao menos, ocupar funções que nós, meros mortais, já não exercemos tão bem. Parece ficção, mas a cena digna da série “Os Jetsons” está cada vez mais próxima. Basta observar nos últimos anos a crescente aplicação de inteligência artificial (IA) e dos subcampos da ciência da computação, como machine learning (aprendizado de máquina, em português).

 

Não há como ignorar o avanço desse mercado. A projeção é que o segmento de inteligência artificial cresça a um ritmo de 46,2% ao ano, com expectativa de atingir US$ 52 bilhões em 2021 (sim, daqui a dois anos), conforme estimativa da consultoria IDC. Para se ter uma ideia, em 2018, os gastos mundiais com IA  foram de US$ 24 bilhões. Machine learning e deep learning devem puxar a trajetória de expansão dos investimentos.

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De acordo com um relatório da Research and Markets, estima-se que o tamanho global do mercado de inteligência artificial ultrapasse US$ 169 bilhões em 2025, o que representaria uma evolução anual de 55,6% entre 2018 e 2025. As cifras são, realmente, gigantescas e refletem um potencial a ser explorado. Quem se preparar, sairá na frente na corrida da transformação dos negócios e do mercado de trabalho. Oportunidades não faltarão, tanto de novos empregos ou carreiras, quanto para empreender. Mas os especialistas em carreira e inovação concordam: é preciso começar o quanto antes a mergulhar nesse terreno fértil de conhecimento.

 

Oportunidades em diversas áreas

 

A demanda por profissionais que consigam navegar em meio aos algoritmos de machine learning tem aumentado. “Estamos precisando de pessoas que saibam de machine learning. Não é um cargo novo, mas sim um cientista de dados que conheça o assunto”, observa Alessandra Montini, diretora do LabData da Fundação Instituto Administração (FIA) e professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).

Quem se preparar, sairá na frente na corrida da transformação dos negócios e do mercado de trabalho. Oportunidades não faltarão

Para quem trabalha hoje com análise de dados, o conhecimento sobre machine learning é um pré-requisito. É por isso que pessoas de diversos setores, incluindo saúde, varejo, finanças e RH, têm procurado formação em IA. Não por acaso, o laboratório comandado por Alessandra na FIA reúne cursos de extensão de inteligência artificial e analytics para profissionais da área médica, de finanças e gestão de pessoas.

 

Há, ainda, uma pós-graduação em “Análise de big data”, e outra em “Análise de dados, data mining e inteligência artificial”, ambas com 360 horas. No ano passado, a escola lançou o MBA “Analytics em big data para gestão de negócios”, de 500 horas, voltado aos executivos de alto escalão das companhias, chamados de C-level. “Também começamos a fazer parcerias com grandes empresas”, conta Alessandra.

 

Outras instituições, como Universidade Presbiteriana Mackenzie, ESPM, Insper e FIAP, ampliaram a grade de cursos com programas na área de ciência de dados. A Faculdade Impacta inseriu a disciplina de machine learning nos cursos de graduação em ciência da computação e engenharia da computação, assim como na pós em inteligência artificial.

 

Setores como finanças, varejo e saúde têm liderado a adoção de machine learning, na visão dos especialistas. Grandes bancos brasileiros, por exemplo, montaram nos últimos anos equipes de data science, com cientistas de dados, arquitetos de dados e engenheiros de machine learning. Hospitais e grandes redes varejistas investem cada vez mais em análise de dados. Ainda assim, encontrar profissionais qualificados não tem sido uma tarefa das mais fáceis para empresas de todos os tamanhos, inclusive startups. Em outras palavras, a equação não fecha.

Grandes bancos brasileiros montaram nos últimos anos equipes de data science, com cientistas de dados, arquitetos de dados e engenheiros de machine learning

“O maior desafio está ligado à capacitação. Mesmo os cursos tradicionais de ciência da computação não atendem a essa demanda”, avalia Bruno Lima, coordenador dos cursos de graduação em engenharia da computação e tecnólogo em redes de computadores da Faculdade Impacta e professor do Mackenzie. Segundo o professor, há um campo vasto de atuação para quem se especializa no desenvolvimento de máquinas de aprendizagem ou mesmo para aquela pessoa que fica responsável por separar o joio do trigo, ou seja, fazer a análise acurada a partir de um grande volume de dados.

 

Conhecer linguagens de programação é só o primeiro passo

 

Quero trabalhar com machine learning, e agora? Descobrir os meandros de linguagens de programação é apenas o passo inicial no caminho da especialização. Habilidades de estatística, matemática e raciocínio lógico são cruciais para alçar voos mais altos na carreira. A explicação é simples: algoritmos são sequências lógicas para solucionar determinados problemas. Mas isso não basta. “É preciso ter um perfil analítico, gostar de inovação e entender as regras de negócio”, observa Lima.

 

Como se pode notar, o leque de competências é amplo e, claro, dificilmente alguém saberá tudo. Por isso, a tendência é que sejam criadas equipes multidisciplinares nas empresas, com pessoas que programam as máquinas, bem como quem cuida da manipulação dos dados, ou ainda o profissional que faz a ponte do time técnico com as áreas de negócios.

 

O perfil do cientista de dados tem mudado nos últimos anos. Tradicionalmente, esse profissional tinha como função desenvolver modelos estatísticos e matemáticos. “Agora é preciso fazer o ‘link’ com negócios, TI e infraestrutura, ter capacidade de articulação e liderança”, aponta Luiz Malere, consultor do SAS. Para o especialista, a capacidade analítica será cada vez mais valorizada no mercado. “A interpretação de resultados dos modelos e aplicação dos resultados para mudanças e melhorias nos negócios é uma potencial vaga de trabalho”, diz. A tendência é que surjam oportunidades para cientista de dados focados em análise de sentimentos em redes sociais, ou seja, profissionais dedicados a medir a efetividade de campanhas nessas mídias.

Descobrir os meandros de linguagens de programação é apenas o passo inicial. Habilidades de estatística, matemática e raciocínio lógico são cruciais para alçar voos mais altos.

Outro desafio é o próprio amadurecimento do mercado e das empresas em relação ao uso, de fato, de técnicas de IA, incluindo machine learning. “Vejo que empresas de médio porte, em geral, estão apagando incêndio e não têm um DNA de inovação”, comenta Lima, da Impacta. A procura por profissionais é crescente, mas muitas companhias ainda não sabem exatamente quais problemas querem resolver com a aplicação de machine learning, complementa Jhonata Emerick, presidente da Associação Brasileira de Inteligência Artificial (ABRIA) e sócio das startups DataRisk e RadSquare. “Muitas empresas ainda nem montaram um data lake [repositório que armazena um grande volume de dados]”, afirma.

 

Machine learning pode virar negócio

 

A curiosidade pela inteligência artificial levou Emerick, engenheiro aeronáutico de formação, a estudar em profundidade o tema. Após trabalhar na Embraer e em instituições do setor financeiro, como Itaú Unibanco e Rio Bravo Investimentos, ele decidiu empreender. Foi um dos fundadores da Rapiddo, aplicativo de delivery comprado pelo iFood no ano passado. Em 2017, montou a DataRisk, startup que atua com desenvolvimento de modelos preditivos, principalmente para o setor financeiro. Já a RadSquare usa inteligência artificial na radiologia – o negócio nasceu de uma pesquisa de médicos do Hospital Albert Einstein e, neste ano, a startup recebeu investimento do hospital.

 

Formado em sistemas da informação, Jones Granatyr chegou a trabalhar na área de desenvolvimento de softwares, mas foi na academia onde descobriu a inteligência artificial. O gosto pelo assunto foi tamanho que ele fez mestrado e doutorado em ciência da computação, ambos focados em IA, e está prestes a concluir o pós-doutorado na área. “Quando fiz o mestrado, entre 2011 e 2012, não existiam aplicações práticas de inteligência artificial como há hoje”, conta.

 

Depois de lecionar em universidades no interior de Santa Catarina e Paraná, na região Sul do país, nos últimos anos ele tem se dedicado a cursos online – um deles já teve mais de 8 mil inscritos, segundo Granatyr. O professor criou também o IA Expert, site com novidades sobre a área de inteligência artificial.

 

Para quem deseja montar um negócio na área, Granatyr indica dois caminhos: ir atrás de cursos para se especializar e, assim, poder prestar consultoria para organizações. “Muitas empresas de médio porte não sabem como o negócio pode ser beneficiado com machine learning”, diz. Outra possibilidade é realmente adotar a veia empreendedora e desenvolver soluções baseadas em aprendizado de máquina.

Para quem deseja montar um negócio na área, um caminho é ir atrás de cursos para se especializar e, assim, poder prestar consultoria para organizações

Foi o que fez a VidMob, empresa americana criada há cerca de seis anos. No Brasil desde maio deste ano, a startup é uma plataforma de inteligência criativa, especializada em criação de vídeos, análise de dados e otimização de ponta a ponta. A empresa tem parceria com as principais plataformas digitais: Google, Facebook, Instagram, YouTube, Twitter, Snapchat, Pinterest e LinkedIn. A inteligência artificial e o machine learning são aliados do negócio. “O que fazemos é utilizar nossa inteligência computacional para acelerar o processo criativo e fornecer aos criativos as melhores escolhas em relação às estratégias e execução artística”, explica o publicitário Camilo Barros, head de parcerias da VidMob na América Latina.

 

O trabalho funciona assim: os vídeos de campanhas são reduzidos nas menores partes possíveis e a empresa analisa um conjunto de elementos, por exemplo, se a pessoa está feliz ou triste, o que foi falado e por aí vai. O passo seguinte é comparar cada um dos elementos com mais de 30 métricas extraídas das plataformas digitais. “A inteligência artificial pautada em machine learning vai aprendendo e, a partir daí, gera insights criativos. Mas a decisão de usar ou não cada insight é humana”, diz.

 

O primeiro projeto feito pela VidMob no Brasil foi para a linha exclusiva de cervejas artesanais da Colorado, a “Brasil com S”. Em parceria com a Zx Ventures, unidade de inovação da AB Inbev, a startup adaptou o vídeo-manifesto originalmente criado para o site da Colorado, para desenvolver vídeos mobile de alta performance para Facebook, Instagram e YouTube. Divulgada em setembro deste ano, a campanha teve aumento de 81% na taxa de cliques e crescimento de 69% na taxa de visualização.

 

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