Todo homem é uma ilha

Author Photo
2:42 pm - 21 de julho de 2014
John Donne, poeta inglês do séc. XVII, deixou poemas e frases que se imortalizaram. Dentre elas a famosa “Nenhum homem é uma ilha, completo em si próprio. Cada ser humano é uma parte do continente, uma parte de um todo”. As empresas globais do segmento de TI, muitas vezes, demonstram que acreditam exatamente no contrário. Como distribuidores, trabalhamos com dezenas de fabricantes com forte atuação internacional. Constatamos que cada vez mais eles montam no Brasil estruturas verticais, que criam silos, dificultam a formação de times e incentivam o individualismo.

Os exemplos são inúmeros e dramáticos. Fiz muitos negócios com um fabricante que tinha 130 funcionários no Brasil. Somente 30 indivíduos de vendas reportavam-se ao Country Manager. Os outros 100 reportavam-se a outros 23 executivos fora do Brasil. Como esse fabricante pode criar o time Brasil? Muito difícil, quase impossível. O Country Manager não passava de um Diretor de Vendas, sem nenhuma autoridade para definir objetivos e fazer todos os 130 moverem-se como um bloco em direção a eles. Conheço um outro fabricante que tem quatro funcionários no Brasil. Um Gerente de Contas, um Engenheiro de Sistemas, um Gerente de Contas de Canal e um Executivo de Marketing. Reportam-se a quatro diferentes chefes nos EUA. Pouco se falam. Em nada se ajudam. Comportam-se como se pertencessem a quatro diferentes empresas. Os resultados, claro, são pífios.

Por que isto ocorre? A região da América Latina, incluindo o Brasil, reporta-se nos organogramas das empresas globais, na sua esmagadora maioria, à região “Américas”, com sede nos EUA. Tudo muito natural. Acontece que para atender ao maior mercado do mundo, o norte-americano, é necessário dividir a empresa em várias seções, departamentos, divisões e unidades de negócio que fazem todo o sentido lá, para acomodar centenas ou milhares de funcionários. Em nome de uma normalização de processos e estruturas organizacionais, elas são “baixadas” para a América Latina e aqui aplicadas integralmente. Ganha-se uma consistência de processos, mas criam-se monstros ineficientes como os dois que citei anteriormente.

Como resolver esse impasse? Cada caso deve ser analisado com cuidado, mas é fundamental que o Country Manager ou Diretor-Geral seja imbuído de poder para criar um time local. Único. Os funcionários podem estar organizacionalmente ligados, por linhas pontilhadas, a departamentos globais, mas por linhas cheias às lideranças locais. Com isso garante-se consistência de processos, sem perder a força que o time encerra. 

A famosa frase “pense globalmente e aja localmente” parece que foi esquecida com os escândalos do início da década de 2000, que precipitou este fenômeno das estruturas verticais. Leis como Sarbanes-Oxley e melhorias na governança das empresas, mitigaram os riscos das gestões locais independentes, tornando desnecessárias estas estruturas verticais engessadas. Por tudo isso está na hora de as empresas globais revisitarem Donne, não acham?

Newsletter de tecnologia para você

Os melhores conteúdos do IT Forum na sua caixa de entrada.