Mais mulheres na tecnologia?

Eventos de tecnologia como a Campus Party são excelentes oportunidades de avaliar como o tema evoluiu ao longo dos anos

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4:56 pm - 21 de fevereiro de 2019

A Campus Party é um dos maiores eventos de tecnologia do mundo e mudou muito ao longo das suas 12 edições. A PrograMaria participa da Campus desde que surgimos, em meados de 2015, com a missão de empoderar mulheres com tecnologia e programação.

Por coincidência ou não, a 12ª edição do evento aconteceu na mesma semana em que se comemorou o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência, data criada pela ONU em 2015 com o objetivo de celebrar os feitos de mulheres na área e incentivar as novas gerações a buscarem carreira científica.

Em 2008, na primeira edição brasileira, apenas 8% do público era feminino. Ano passado, a organização do evento registrou 43% de mulheres entre os campuseiros. Essa mudança foi fruto da organização das mulheres em torno do tema, multiplicaram-se coletivos e grupos para discutir o tema e mostrar que lugar de mulher é onde ela quiser.

Embora ainda não existam dados oficiais da edição de 2019, houve preocupação em incluir minorias no evento, confirmando a tendência cada vez mais forte e necessária do mercado: promover diversidade. Não só porque isso é bacana do ponto de vista do posicionamento das marcas, mas porque um evento, uma empresa, um time diverso é melhor: as diferentes perspectivas enriquecem a troca de experiências e a colaboração. Os resultados são melhores, mais criativos, contemplam diferentes visões de mundo e todos crescem com isso.

Pela primeira vez, a prefeitura da cidade de São Paulo, apoiadora da Campus Party, fez uma ação direta para impactar a presença de mulheres: foram distribuídas 140 vagas no campings e 655 ingressos para o público feminino. Foi neste ano, também, que um painel totalmente feminino ocupou pela primeira vez o palco principal da Campus. Mariana Macário, Maitê Lourenço, Mariana Sampaio, Luciana Camargo, Daniela Botaro e Kamila Camilo, subiram ao Feel The Future, no dia 13, em uma conversa sobre os desafios da equidade de gênero em empresas.

Do palco, Maitê Lourenço, fundadora da BlackRocks, chamou atenção da plateia para o fato de que o público do evento, assim como todo o setor de tecnologia, ainda é composto por uma maioria branca. “Olhem ao redor e vejam quantas pessoas negras tem perto de vocês. Quem não se incomodar com essa imagem, a gente precisa conversar”, disse. Não dá para falar de diversidade se não formos além das perspectivas de gênero.

Coluna 1

Aliás, equidade de gênero, diversidade em empresas, maternidade, assédio, racismo, empreendedorismo e preconceito dentro das áreas de STEM (do inglês, Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) foram temas recorrentes nos painéis comandados por mulheres que atraíram o público feminino em massa.

Eu participei de um painel com Alda Rocha, Ana Fontes e Liliane Tie no mesmo Feel the Future com o tema: “Girl Power: mulheres que mudam o mundo”. Compartilhamos experiências pessoais do dia a dia das áreas de tecnologia, empreendedorismo e programação.

“A gente é mais da metade da população, a gente já sabe que mulheres têm que ter os mesmos direitos que os homens, a gente já sabe onde estão os problemas.”, disse Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora. “O próximo passo é buscar soluções verdadeiras, que não passam se não tiver homens envolvidos na conversa”, provocou, falando diretamente com os poucos homens que integravam a plateia.

Falamos também sobre os desafios que encontramos nesses espaços. Um estudo da Sociedade Brasileira de Computação mostra que apenas 15% dos alunos matriculados em cursos de Ciência da Computação são mulheres e, de acordo com o PNAD, oito em cada dez alunas dos cursos relacionados à Tecnologia da Informação desistem no primeiro ano.

Não adianta só contratar mulheres, se elas não encontrarem nas empresas um ambiente para se desenvolver, em que ela seja tratada com respeito, com os mesmos direitos e oportunidades que seus colegas homens. Caso contrário, ela será expelida. A falta de um ambiente amigável é um dos motivos pelos quais a evasão das mulheres do setor de tecnologia é maior que a dos homens. Ficou claro pelo papo, que mobilizou bastante a plateia, que tem muita gente que precisa discutir esse tema e se informar sobre ele, mas que não o faz porque acham que não lhes diz respeito.

Esse ponto me inquieta bastante: os painéis comandados por mulheres tiveram público composto quase integralmente por outras mulheres. Será que estamos falando somente para outras mulheres? Veja, é fundamental que haja troca entre a gente, exatamente para que o processo de empoderamento alcance todas. Mas onde estão os homens na conversa? O que falta para que eles entendam que também fazem parte da discussão?

Embora estejamos vendo a movimentação das mulheres para ocupar esses espaços, eles ainda são pensados e construídos principalmente para e pelos homens. Durante os cinco dias de evento, pelo menos 21 mulheres passaram pelo Feel The Future, o palco principal. Mas embora os números sobre a presença feminina pareçam animadores, entre os palestrantes magistrais, considerados os principais do evento, apenas 3 eram mulheres: Poppy Crum, Joana D’Arc Felix e Penny Lane. E, delas, apenas a brasileira Joana D’Arc Félix é negra. O “horário nobre” ainda é reservado para homens brancos.

Não basta trazer diversidade, é preciso avançar para a inclusão, para que os espaços reflitam as perspectivas das mulheres e que elas sejam tão valorizadas quanto as perspectivas dos homens. Avançamos, mas ainda há um longo caminho a trilhar. Nesse espaço, inclusive, eu e as colaboradoras da PrograMaria vamos falar sobre possíveis rumos!

* fundadora da PrograMaria

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