Empreendedores, Investidores, Ecossistema: informai-vos!

A importância da Abordagem Principiológica sobre temas de Governança Corporativa relacionados às startups e scale-ups

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10:00 am - 29 de junho de 2022
informação, celular, notebook, laptop Imagem: Shutterstock

O tema da governança corporativa nunca esteve tão em voga no mundo dos negócios. Os debates relacionados a ESG (sigla em inglês referenciando temas ligados a aspectos ambientais, sociais e de governança), por exemplo, não param de crescer – seja em quantidade ou em relevância. Em 2022 também transcorre o quinto aniversário da adoção do modelo “pratique ou explique” pelas companhias abertas brasileiras, em decorrência da edição da Instrução CVM n° 586/2017.

Imagino, agora, a reação do leitor ao título e ao trecho acima. Ele deve indagar-se: “E daí? O que isso tem a ver com as startups e scale-ups?”

A resposta: tudo!

A importância da governança corporativa para as startups e scale-ups – nos seus diferentes estágios e momentos – foi abordada com excelência no Caderno de Governança para Startups e Scale-Ups do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Dentre outras motivações para a observância dos temas de governança pelas startups e scale-ups, destaca-se o fato de serem importantes aliados para o enfrentamento de dificuldades usualmente impostas a um negócio inovador e em formação em um país tão complexo quanto o nosso. Em outras palavras, trata-se de relevante ferramenta de auxílio para diminuir riscos e conflitos passíveis de serem mitigados – a exemplo de temas ligados à sociedade e à gestão do negócio –, reduzindo as problemáticas a serem encaradas pelos empreendedores aos reais desafios originalmente pensados por eles, como testar o produto e/ou serviço no mercado.

Mas, eis que aqui cabe um alerta. Ou melhor, dois.

  1. A prescrição da adoção de boas práticas de governança corporativa não deve ser feita de maneira generalizada e irrestrita, sem que se considere o estágio e maturidade do negócio (registre-se que propositalmente utilizo o termo “negócio” e não “sociedade”, pois é possível que o primeiro exista sem o último, conforme abordado na fase de Ideação do Caderno citado anteriormente). Ou seja, não existe uma abordagem única para todos os casos (ou “no one size fits all”).
  2. “A diferença entre o remédio e o veneno é a dose.” Acredito que essa frase resume perfeitamente a preocupação que se deve ter quando tratamos da aplicação da governança corporativa às startups e scale-ups. Importante destacar que este alerta serve tanto para os empreendedores, como para os investidores-anjos (ou gestores de venture capital) e seus respectivos assessores profissionais (ex: advogados, consultores etc.).

Para ilustrar o segundo ponto de alerta acima, destacaria a discussão sobre conselho de administração em startups. Citado de modo quase unânime pelos ehttps://itforum.com.br/wp-content/uploads/2018/07/shutterstock_528397474.webpsos da governança corporativa como o órgão social mais importante das sociedades (sob a ótica da governança corporativa), o conselho de administração não deve, necessariamente, estar presente nas startups (ou, mais ainda, desde a sua formação). Seja em razão de eventual custo ou da “burocracia” excessiva e desnecessária – em especial no estágio inicial da jornada da startup, em que os recursos são bastante escassos e sua alocação deve estar primordialmente focada no produto ou serviço a ser desenvolvido e ofertado –, o conselho de administração, por exemplo, pode não vir a ser recomendável (especialmente, nas fases de Ideação e Validação ou, mesmo, na fase de Tração).   Alternativamente à criação do conselho de administração, existe, por exemplo, a figura do conselho consultivo, que pode cumprir função semelhante, sem, contudo, encarecer ou enrijecer a estrutura da startup.

Sem prejuízo da consideração acima feita à luz da realidade das startups, reconhecemos e destacamos a importância do conselho de administração – estratégica e deliberativa – em outras estruturas empresariais, como, por exemplo, as companhias abertas.

Como se sabe, a abertura de capital, mediante a realização de Oferta Pública de Ações (IPO, do inglês Initial Public Offering), é um dos caminhos de saída e liquidez de empreendedores e investidores em startups e scale-ups. Seja em razão de se tratar de um dos possíveis caminhos a serem trilhados por elas ao longo de sua jornada, seja pela quantidade e qualidade de estudos acerca de governança corporativa existentes para as companhias abertas, deixamos aqui o convite à reflexão para todos que pretendem aplicar boas práticas de governança às startups e scale-ups, fazendo justamente uma conexão com o que talvez seja a organização mais distante de si próprias (seja em estágio, forma ou estrutura), qual seja, a companhia aberta. E fazemos isso para demonstrar que é possível que se adotem boas práticas de governança corporativa em qualquer modelo, formato e estágio da organização, desde que com prévia reflexão. Ou dito de outra forma: mediante tomada de decisão informada e ponderada.

Conforme destacado no início, junho de 2022 representa o quinto ano do início da adoção do modelo “pratique ou explique” pelas companhias abertas brasileiras, mediante a incorporação do Código de Governança Corporativa – Companhias Abertas, elaborado pelo Grupo de Trabalho Interagentes (GT Interagentes – sob a coordenação do IBGC e com a participação de importantes entidades relacionadas ao mercado de capitais brasileiro) às normas regulatórias aplicáveis às referidas companhias (em especial, a Instrução CVM n° 480/09).

De acordo com o próprio Código de Governança Corporativa – Companhias Abertas:

“O modelo ‘pratique ou explique’ é amplamente aceito e reconhecido internacionalmente como o que melhor se adequa a códigos de práticas de governança corporativa. Esse sistema reconhece que a prática da governança corporativa é uma jornada e não deve se traduzir em um modelo rígido de regramento aplicável igualmente a todas as companhias. Pelo contrário, ele é principiológico e flexível, dando às companhias a liberdade para explicar a eventual não adoção de determinada prática.” (grifos nossos)

Assim, com o empréstimo de um conceito aplicável à governança de companhias abertas, reforço aqui o recado: a forma de se analisar, sugerir e adotar boas práticas de governança corporativa às, ou pelas, startups e scale-ups não é uma receita de bolo; não existe uma fórmula única, aplicável de maneira geral e indistinta a todos; tal forma deve levar em consideração, dentre outros, o momento e maturidade em que o negócio se encontra e ser periodicamente revisitado, pois a situação não é estática – mas sim de fluidez constante.

Empreendedores, Investidores, Ecossistema: informai-vos!

Conhecimento e princípios são mais importantes do que a aplicação automática e não refletida de prescrições rígidas de práticas de governança corporativa (muitas vezes não recomendáveis ao momento e forma das startups e scale-ups).

E por fim pergunto: já não é chegado o momento de se aplicar o modelo “pratique ou explique” de governança corporativa para as startups e scale-ups? Em caso afirmativo, sugiro conhecerem a ferramenta de Métrica de Governança para Startups e Scale-ups do IBGC !

*Fernando Gentil Monteiro é sócio do GVBG | Gentil Monteiro, Vicentini, Beringhs e Gil Advogados, professor de direito com atuação em temas ligados à governança corporativa e membro da Comissão de Startups e Scale-Ups do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)

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