De pais para filhos

Author Photo
4:23 pm - 07 de agosto de 2015


No início da década de 70, o bairro Parque São Rafael, no
extremo sudeste de São Paulo, ainda ocupava uma zona essencialmente rural da
cidade. Me lembro do chão de terra, das poucas casas na rua em que morava. A
região, quase na divisa com Mauá, no Grande ABC, começava a se desenvolver,
abrigando trabalhadores que chegavam para trabalhar nas indústrias locais. As
lembranças do momento em que cheguei à capital, com meus pais e quatro irmãos,
não são muitas, mas fábricas e chaminés no horizonte permeiam minha memória.


Eu tinha cinco anos quando partimos da roça para a cidade
grande. Uma decisão impulsionada por minha mãe, por sua inquietude de querer
melhorar o nosso padrão econômico. Ela desejava deixar aquela vida interiorana.
Outro motivo que encorajou nossa mudança foi minha saúde. Meses antes, eu
estava comendo melancia quando minha tia, brincando comigo, correu atrás de
mim. Na distração, ou talvez no segundo de euforia, aspirei um caroço de
melancia e ele foi parar no pulmão. Esse episódio desencadeou sérios problemas
respiratórios. Asma, bronquite.

Ao transferirem nossas vidas para a cidade, meus pais buscavam
me proporcionar um tratamento mais adequado. Eles só não contavam que, na
capital, o clima úmido e frio, junto com a poluição gerada pelo novo polo
petroquímico da região, agravaria minhas crises. E, no auge da respiração
desesperada e do movimento violento do peito, para dentro e para fora, tinha a
sensação de que iria morrer.

Por várias vezes, corremos para o hospital, para sessões de
inalação. Correr atrás da minha saúde, por sinal, sempre foi uma constante, até
a vida adulta. Pequenos problemas. Alguns, crônicos. Outros, quem sabe,
consequência das experiências da infância. Não sei dizer. Mas certamente as
decisões de meus pais determinaram a trajetória daquele menino de cinco anos de
idade, ainda pequeno para alcançar o comando do próprio destino.

O que teria acontecido se não fosse a obstinação de minha mãe
– e, não muito depois, a minha também? Em que condição estaríamos se tivéssemos
ficado lá, no interior? Que caminho teriam tomado meus próprios filhos? Tudo
poderia ter sido diferente. Tudo por causa de uma decisão.

Digo ao Vitor e ao Gabriel, meus filhos, que não estou criando
uma trajetória empresarial para simplesmente deixar um legado a eles. Eles também
terão que construir suas próprias obras. Mas é claro que me mantenho por perto.
Oriento, direciono, apoio. Quase sempre, me preocupo: será que estou
influenciando os garotos da forma certa? Será que estou fazendo o mais adequado
para eles?

Eterno dilema de pai. E também de empreendedor, líder,
influenciador.

Nenhum movimento acaba em si mesmo, não é mesmo?

Newsletter de tecnologia para você

Os melhores conteúdos do IT Forum na sua caixa de entrada.