IFRS 9 e CMN 4.966: o que as novas regras significam para o CIO?
Bancos precisarão avançar modelos analíticos para se adequar às regras de previsão de perda esperada de crédito e normas internacionais
No mercado financeiro, garantir a conformidade às regulamentações é uma constante na vida do tomador de decisão de tecnologia – e o IFRS 9 e a CMN 4.966/21 são exemplos de regras importantes que trazem um convite à reflexão sobre como tecnologias, incluindo data analytics, podem ajudar nesse processo. Para o tomador de decisão, é importante entender como esses dois regulamentos se entrelaçam e por que isso é de grande importância para executivos de tecnologia no Brasil.
Embora tenham origens diferentes, o IFRS 9 e a CMN 4.966 são dois marcos regulatórios que estão muito ligados no cenário financeiro brasileiro. Ambos abordam a contabilização de instrumentos financeiros e têm um impacto substancial em instituições financeiras e empresas no país – impactando também as áreas de tecnologia das empresas do setor. Antes de comentar sobre a relação destes temas com a estratégia de dados de forma mais específica, cabe uma breve explicação sobre a função de cada uma destas regulamentações:
A IFRS 9 (Norma Internacional de Relato Financeiro 9) é uma norma internacional que aborda a contabilização de instrumentos financeiros. Esta regra especifica como uma entidade, como um banco, deve classificar e mensurar ativos financeiros, passivos financeiros e alguns contratos de compra ou venda de itens não-financeiros. Já a Resolução CMN 4.966 refere-se a uma resolução para o Brasil, promulgada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Ela estabeleceu os critérios para a implementação do modelo de perda esperada de crédito para instituições financeiras reguladas, em linha com as regras do IFRS 9.
A promulgação da Resolução CMN 4.966 demonstra o compromisso das autoridades regulatórias brasileiras em alinhar seu sistema financeiro com os padrões internacionais. Este alinhamento traz oportunidades e desafios para os tomadores de decisão em tecnologia em instituições, e exige uma revisão abrangente de seus sistemas, processos e capacidades atuais.
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Com este cenário em mente, o principal aspecto da resolução para os bancos se refere às perdas esperadas. O banco deixa de olhar só para o histórico, e passa a definir o saldo em risco da instituição com um olhar para o futuro. Aqui, leva-se em consideração fatores como a capacidade futura de pagamento do cliente, dada a situação macroeconômica projetada. É uma visão crucial, pois esta capacidade de projeção de devedores duvidosos afeta o resultado da instituição de forma significativa, podendo trazer maior volatilidade, mas também podendo deixar o balanço muito mais saudável.
Os impactos na estratégia de analytics
De forma mais específica, os bancos já têm a base para caminhar para esta sofisticação regulatória: as regras da CMN não são uma grande novidade. Porém, agora há o olhar para uma provisão ajustada de fato, com a capacidade creditícia futura do cliente.
Implicações gerais para o chief information officer (CIO) envolvem o aspecto de sistemas e gestão de dados, já que ambas as regras exigem mudanças nos sistemas de dados, especialmente em relação à forma como os instrumentos financeiros são classificados e medidos, e ainda a forma como os sistemas legados serão integrados.
Ainda sobre os dados que a instituição passa a agregar dentro desse processo, é preciso um novo olhar sobre a carteira de crédito, e como as variáveis macroeconômicas serão relacionadas com esta carteira. Aqui, o analytics pode ajudar a buscar a correlação com as variáveis macro, viabilizando assim uma visão mais completa de quais são as variáveis macroeconômicas que mais podem afetar as carteiras de crédito a que a instituição está exposta. A inteligência artificial ajuda muito com atalhos nesse processo.
Há também o elemento de análise preditiva e modelagem. Sob o modelo de perda esperada de crédito estabelecido pela resolução, as instituições financeiras precisam ter capacidades robustas de modelagem preditiva para antecipar possíveis perdas. O aumento das exigências de divulgação significa que os líderes de tecnologia também devem garantir que possuem ferramentas de relatórios robustas, que podem gerar insights detalhados e oportunos.
Para além de todos estes aspectos, não adianta ter um modelo de analytics muito bom, se a organização não tem uma qualidade de dados boa para trabalhar. E aqui no que diz respeito à CMN 4.966, a conversa não foge muito a esse ponto. Hoje, os bancos já têm bases muito boas, mas a partir do momento em que novas informações entram no jogo para permitir um bom modelo de perda esperada, é preciso ter uma área de tecnologia que responde para o negócio, onde são definidas as relações necessárias para a análise, bem como o ciclo de modelagem propriamente dito. Hoje temos bancos que operam esta estrutura, que funciona muito bem.
Nessa tropicalização do IFRS 9 para o Brasil, também é importante lembrar que nem sempre as instituições estavam utilizando os melhores modelos, deixando espaço para melhorias. Agora, diante deste desafio, os bancos precisam identificar os modelos mais adequados ou testar os modelos que já utilizavam. Além disso, precisarão não só criar os modelos, mas também determinar em que momento relacioná-los aos produtos financeiros.
Outro desafio é simular a carteira de crédito, levando em consideração que agora é necessário considerar variáveis macroeconômicas. Ou seja, ter um ferramental para executar teste de toda a carteira para buscar a combinação que melhor reflita os riscos de crédito assumidos pelo banco, relacionando com os diversos produtos e segmentos, é fundamental para atingir o nível correto da perda esperada.
Essa simulação/revisão dos modelos ou evolução dos modelos de IFRS 9 para a nova regulamentação brasileira está gerando um número maior de modelos para a área de risco gerenciar. Com isso surge a questão do “risco do modelo”, que com um número maior de modelos impactando os resultados da instituição e afetando as reservas de crédito, torna-se mais um risco relevante associado ao processo de adequação à CMN 4.966.
Por fim, o IFRS 9 e agora a Resolução CMN 4.966 trouxeram um aumento significativo na importância dos projetos relativos à contabilização de perdas esperadas de crédito, exigindo a participação de todos os envolvidos, de finanças a risco, para garantir um processo único de implementação e conformidade.
Ainda há um ano pela frente para que empresas possam se adequar e calibrar seus modelos. Nesse interim, é importante que tomadores de decisão continuem a estudar o impacto da resolução, para evitar efeitos adversos na capacidade de previsão destas perdas e, consequentemente, no resultado como um todo.
*Thiago Escrivão é gerente de soluções do SAS para a América Latina
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